São Paulo, segunda, 15 de junho de 1998

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Uchida não se seduz pelo brilho

especial para a Folha

Última obra instrumental de Schubert, a "Sonata para Piano em Si Bemol Maior (D. 960)" começa com um longo movimento "molto moderato", de rara placidez, sussurrado em pianíssimo. A atmosfera serena, resignada e também temerosa, desse movimento é interrompida por uns poucos breves compassos de maior força, mas volta a imperar.
A música, aqui, deve ser tocada de maneira a soar como se viesse de longe, e é possível que Schubert pretendesse expressar, dessa maneira, o indizível desses seus sentimentos e sensações.
Em sua belíssima leitura dessa "Sonata", a pianista Mitsuko Uchida expressa a atmosfera mística desse movimento com uma profundidade emocional que fará muitas das leituras mais conhecidas desse número parecerem tão superficiais quanto uma polca de salão. Com sabedoria, ela mergulha, de maneira exaustiva, nos conteúdos da partilha e revela o intenso poder dramático de cada uma de suas notas. Uchida parece reviver a condição existencial do próprio compositor.
Se Uchida é insuperável ao recriar o lado escuro desta sonata, nos dois movimentos finais ela se mostra uma virtuose que não se deixa seduzir pela facilidade e pelo brilho. Mantém uma seriedade etérea nos delicados arabescos e na inspiração folclórica do Scherzo e expressa, no sanguíneo Allegro "ma non troppo", a plenitude do significado de cada nota, numa interpretação cheia de temperamento, que torna visíveis não só os contornos de um vulcão, mas a lava incandescente que ferve em seu interior. (LSK)

Disco: Sonata em Si Bemol Maior D. 960
Pianista: Mitsuko Uchida
Lançamento: Philips (importado)
Quanto: R$ 28, em média



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