São Paulo, sábado, 15 de julho de 2006

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MANUEL DA COSTA PINTO

Resumo de paisagem

Lançamento reúne 30 anos de obra do poeta mineiro Júlio Castañon Guimarães e mostra síntese e depuração

"POEMAS (1975-2005)": o título é simples mas eloqüente. Designa 30 anos da obra de Júlio Castañon Guimarães, poeta que nasceu em Juiz de Fora (MG) e mora no Rio de Janeiro, onde é pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa.
As três décadas de literatura contidas no volume poderiam significar -o que não é pouco- uma bibliografia alentada, sua presença obrigatória em antologias e uma respeitável fortuna crítica. No caso de Castañon Guimarães, permitem observar ainda uma depuração perceptível de livro a livro, de poema a poema.
Sua produção já havia sido reunida em "Matéria e Paisagem", livro de 1998 que incluía títulos anteriores como "Vertentes" (1975) e "Dois Poemas Estrangeiros" (1995). Depois vieram "Práticas de Extravio" (2003) e uma série intitulada "Ensaios, Figuras" (2005), que ficara inédita e agora abre o conjunto da obra.
Considerado um autor metalingüístico, Castañon Guimarães nunca deixou de introduzir, mesmo em seus trabalhos mais experimentais, elementos de uma comoção pouco freqüente no construtivismo: "sombras ancestrais" de Minas, "pedras da memória", "vento vindo de outras eras" -e de outros poetas, como se percebe nas referências a Drummond e Murilo Mendes. Não seria errado dizer que ele conseguiu promover uma síntese improvável das ironias e do "sentimento do mundo" desses poetas com os valores da poesia concreta (presentes na visualidade de "17 Peças", de 1983).
Já a partir de "Inscrições" (1992), porém, revela-se o sentido de sua atenção para os elementos compositivos. Não se trata de afirmar a autonomia da palavra-coisa, mas de utilizar a linguagem como porto seguro, como pauta que disciplina a desordem de experiências e afetos. Em "Práticas de Extravio", ele se concentra na busca de hipóteses de apreensão do real -"um espaço ainda dentro da percepção/ como um corpo a que se quer", conforme escreve no poema "Os Dias".
E, no trecho de "Ensaios, Figuras" que abre "Poemas (1975-2005)", sintetiza essa fenomenologia: "vagamos e alguns desvios/ precária operação que/ se desencadeia um tempo/ também o indefine/ nem mera improvisação/ como rota de acidentes/ que desmantelem o intento/ antes a própria sintaxe/ se encaixes tão falhos/ não propriamente desordens/ mas essa narrativa/ de espaços e projetos/ mas umas tantas perdas/ seu descaminho/ entre as sombras".
Da busca metódica de uma perspectiva do olhar em "confronto com a dispersão", com o tumulto das coisas, brota o "esgarçamento da consciência". A alternância entre cálculo e abismo, entre a "micro-escrita da imaginação" e os "sistemas de ruínas" do mundo exterior, sempre esteve presente na poética de Júlio Castañon Guimarães, cuja inquietação metafísica reverbera Fernando Pessoa (como se lê em "Fragmento Olisiponense"). Torna-se mais clara agora, nesse "resumo de paisagem".



POEMAS (1975-2005)

    
Autor: Júlio Castañon Guimarães
Editora: Cosacnaify/7 Letras
Quanto: R$ 30 (240 págs.)



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