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CINEMA - EUA
"Olhos de Serpente" alivia temporada ruim
BIA ABRAMO
especial para a Folha, em Berkeley
A grande corrida pela bilheteria
que é a temporada de verão norte-americana ganha ares mais cinematográficos. Saem os técnicos
em efeitos especiais, os roteiristas
indigentes, os diretores de videogame. Quem está na briga agora
pelos dois primeiros lugares são
dois diretores de verdade: Steven
Spielberg, com "O Resgate do
Soldado Ryan", e Brian De Palma, com "Olhos de Serpente".
É um alívio. Sim, ambos são espetaculosos, mas, comparados a
"Armageddon" e "Impacto Profundo", há algo a mais. Em Spielberg e De Palma, o espetáculo não
é simplesmente uma maneira descarada de atrair bilheteria: é resultado de uma apuração técnica de
ordem, digamos, mais pessoal.
A crítica norte-americana não
deu muita bola para "Olhos de
Serpente" -com previsão de estréia no Brasil para 25 de setembro- e, de fato, não é um De Palma especialmente inspirado. Mas,
depois de monstros verdes e asteróides em desabalada carreira, um
thriller neurótico com Nicolas Cage e Gary Sinise representa um
certo alívio.
Apesar de o roteiro de De Palma
e David Koepp parecer meio costurado às pressas, há mais inteligência em um minuto de "Olhos
de Serpente" do que em todos esses outros blockbusters somados.
"Olhos de Serpente" começa
com 20 minutos alucinantes
-aliás, aberturas virtuosísticas
estão na moda em Hollywood.
Uma chuva torrencial cai sobre
o cassino de Atlantic City, onde
haverá uma luta de boxe. Rick
Santoro (Nicolas Cage), um policial corrupto, falante, intenso,
aposta US$ 5.000 na luta, fala num
horrível telefone celular alternadamente com a mulher e a amante, persegue e extorque um traficante e, ufa, ainda encontra seu
melhor amigo, Kevin Dunne
(Gary Sinise), um oficial da Marinha que está fazendo a segurança
do secretário da Defesa.
Nos próximos dez minutos, o secretário da Defesa é assassinado,
uma loira leva um tiro, um dos
boxeadores vai a nocaute e o pânico se instala entre as 14 mil pessoas
no estádio. No resto do filme, Santoro vai reconstituir o "quem matou" e o problema é que cada um
conta uma história diferente.
Apesar da inspiração clara em
"Rashomon", de Kurosawa,
"Olhos de Serpente" tem defeitos
visíveis, soluções tiradas do bolso,
personagens inconsistentes.
Mesmo com os problemas, há
tours-de-force memoráveis: a
steadycam que segue o ritmo nervoso de Santoro no corredores do
estádio e nos informa sobre a personalidade do policial sem que seja necessária uma palavra, as passagens quase imperceptíveis entre
imagens de vídeo, do circuito interno de TV e da câmera, como se
a realidade fosse um contínuo de
intrepretações intercambiáveis.
De Palma tem um senso de ritmo que não dá espaço para a monotonia e uma exuberância visual
que nunca deixa de surpreender.
Cage faz seu arroz-com-feijão.
Seu Santoro de "Olhos de Serpente" parece o Sailor de "Coração
Selvagem" alguns anos mais velho. Sinise, entretanto, encontrou
uma fluidez entre a cara de pôquer, impassível, e uma malevolência sutil que devem lhe garantir
mais uma indicação ao Oscar de
coadjuvante.
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