|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MOSTRA DE SP
Cinema britânico dos anos 90 pede passagem
AMIR LABAKI
da Equipe de Articulistas
Oito produções britânicas dos
últimos dois anos pedem passagem na atual 23ª Mostra. É numericamente a terceira maior representação, perdendo para a americana, para a francesa e empatando com a alemã e a japonesa.
Mas números também enganam. Nenhuma destas equipara-se ao vigor contemporâneo do cinema produzido pela Grã-Bretanha pós-Thatcher.
Há muito tempo, pelo menos
desde meados dos anos 80, enquanto o cinema europeu sobrevive de autores isolados (como
Almodovár na Espanha e Moretti
na Itália), a produção britânica
reergue-se em bloco.
O festival de Veneza de 1997 radiografou o fenômeno com um
histórico ciclo "British Renaissance". Até o Oscar bateu continência no ano passado, com o triunfo
de "Shakespeare Apaixonado" e
os prêmios a "Elizabeth".
Mas o atual cinema britânico
vai muito além de revisitas a Shakespeare e de épicos imperiais.
Pluralidade de temas e estilos é a
regra no novíssimo cinema inglês.
É um fenômeno raro.
O último e principal momento
de efervescência similar data do
final dos anos 50 e início dos 60,
com a explosão do "Free Cinema"
-o precursor britânico da "Nouvelle Vague" francesa. Havia então uma produção típica: a ágil e
crua comédia social, à moda "Tudo Começou no Sábado" (1960).
A década de setenta foi de retração e a de oitenta, de lenta retomada, com a revelação de cineastas de peso como Terence Davies,
Stephen Frears, Peter Greenaway,
Neil Jordan e Mike Leigh.
A presente bonança tem várias e
distintas causas. Uma estável política de incentivo a iniciantes em
curtas-metragens é uma. A significativa ampliação dos recursos
transferidos para a produção, por
meio de uma lei que aplica em cinema uma porcentagem da loteria nacional, é outra. Talento mais
oportunidade -não há segredo.
Sintonia jovem
A retomada fez-se acompanhar
de uma raríssima sintonia da produção com o público jovem. As
cinco maiores bilheterias de filmes ingleses de todos os tempos
foram conquistadas por produções dos anos 90: "Nothing Hill",
"Ou Tudo ou Nada", "Quatro Casamentos e um Funeral", "Mr.
Bean" e "Trainspotting".
O apoio crítico não fica atrás.
Uma pesquisa recente do British
Film Institute (BFI) sobre os
maiores clássicos do século elegeu
nada menos que 17 filmes rodados nesta década e 18 na década
passada entre as cem principais
produções do cinema inglês.
"Trainspotting", adaptado por
Danny Boyle do romance de Irving Welsh sobre o niilismo de
junkies escoceses, conquistou o
décimo posto. Numa pesquisa similar feita entre os leitores da revista mensal "Total Film", ficou
em primeiro.
"Meu Nome é Joe" de Ken
Loach, selecionado para a atual
mostra, também emplacou uma
vaga na lista do BFI. É um modelo
do cinema de preocupação social
que, desde o "Free Cinema", se faz
na Inglaterra como em nenhum
outro lugar.
Outra prova, ainda na mostra?
"Garotas de Futuro", o penúltimo
drama de Mike Leigh ("Segredos
e Mentiras"), sobre o reencontro
de duas ex-colegas de escola.
Mais? "Zona de Conflito", violência sexual em família na estupenda estréia do ator Tim Roth
("Pulp Fiction") na direção.
E a tal variedade? Basta ver os
demais títulos. "Beautiful People"
insere-se na produção étnica que
se fortaleceu a partir dos anos 80
com nomes como Hanif Kureish.
"Quartos e Corredores" representa o humor homoerótico. "Simon
Magus" é a fábula mágica que
marca a estréia em longa do premiado curta-metragista Ben
Hopkins ("National Achievement
Day"). "Mero Acaso" é nossa santa comédia romântica. Por fim,
"Auschwitz" lembra a força tradicional do documentarismo britânico.
Renovação é isso: nenhum deles
tem Michael Caine.
Texto Anterior: Cinema: "Os Carvoeiros" tem primeira exibição Próximo Texto: Roth arromba na estréia Índice
|