São Paulo, Sexta-feira, 15 de Outubro de 1999
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TEATRO
O diretor deve estrear em janeiro do próximo ano "Scapino", do autor francês, em que presta homenagem ao comediante italiano Totó
Cacá Rosset prepara Molière italianado

Lili Martins/Folha Imagem
No ensaio da peça, o diretor e ator Cacá Rosset posa junto a Claudio Lopomo, o falso Totó


ANA PAULA RAGAZZI
da Redação


Dois malucos andam à solta pelas ruas de São Paulo. No passado, apareciam vestidos de caça-fantasmas e irmãos Metralha e foram vistos pegando no pé dos políticos da cidade.
Agora lutam por uma nova causa: o diretor Cacá Rosset e Wagner Sugamele, coordenador de elenco do Ornitorrinco, querem levar adiante a produção da mais nova peça do grupo, "Scapino" -do original "Les Fourberies de Scapin" (As Artimanhas de Scapino)- escrita por Molière no ano de 1671.
A tática da dupla é simples: abordam pessoas -conhecidas ou não, dependendo do que pretendem conseguir-, enaltecem suas qualidades e sentenciam: "Chegou a hora de você receber a mais justa homenagem e o Ornitorrinco fará isso em seu próximo espetáculo".
"Com essa conversa, já conseguimos o cenário e o pôster para a divulgação, tudo sem pagar nenhum centavo", divertem-se Cacá e Sugamele.
Animados, resolveram testar a lábia com Maria Alice Vergueiro, fundadora do Ornitorrinco, junto com Cacá Rosset e Roberto Galizia, no ano de 1977: "Falamos que ela merecia uma homenagem por aguentar o Cacá há tanto tempo... Ela nem deixou que terminássemos com a história e já foi logo dizendo para nós: "O meu eu quero em grana'".
Toda essa brincadeira já demonstra que os atores entraram no clima do personagem-título da nova peça.
Scapino é definido por Cacá com um "criado esperto", daqueles que mantém com o patrão uma relação de igual para igual: "Ele é um malandro simpático. Faz uma série de armações, mas com a intenção de ajudar", descreve o diretor.
No texto de Molière, Scapino tem de ajudar o patrão, Leandro, a resolver as suas confusões amorosas.
"É uma das últimas peças escritas por Molière e acho que ele retoma algumas características das farsas que escreveu no início de sua carreira", diz Cacá.
A história se passa em Nápoles, na Itália, o que fez com que o diretor aproveitasse a deixa para prestar a "mais justa homenagem" aos imigrantes italianos.
"O texto é atemporal, o que me permitiu situá-lo numa Nápoles contemporânea, aquela retratada nos filmes do comediante italiano Totó", explica Cacá. Totó estará presente na montagem, como o dono da cantina "O Ornitorrinco Que Ri". (leia texto nesta página)
"Scapino" ainda está em sua fase inicial de produção, Cacá termina a tradução do texto de Molière e os ensaios devem ter início ainda este mês.
"Já tenho a montagem muito clara em minha cabeça. Já escolhi um papel perfeito para o Chachá (José Rubens Chachá, ator do grupo) e, é claro, o Scapino serei eu. Por isso sou diretor e ator, para escolher os melhores papéis", afirma Cacá.
Desta vez, ele terá a ajuda de Maria Alice Vergueiro como sua assistente de direção, que, além do dinheiro, fez outra exigência: ter Wagner Sugamele no elenco: "O Cacá argumentou que eu não iria ter paciência de encarar uma temporada, de quarta a domingo", conta Sugamele, "Mas a Maria Alice mandou ele criar um personagem especialmente para mim, para que eu pudesse aparecer, mesmo que não fizesse muita diferença na história, para que eu possa ir só de vez em quando", afirma o ator.
Sugamele será um sapateiro, que terá uma cena, após 1h30 de peça, em que dirá a frase: "O jantar está servido". " Só não me pergunte o que uma coisa tem a ver com outra", diz.
O Ornitorrinco completa 22 anos, e 14 montagens, e mantém sucesso como um grupo que monta comédias populares.
"No Brasil, ela nosso trabalho é visto como merecedor da medalha de bronze. Eu discordo. Uma cebola faz qualquer um chorar, mas qual legume faz alguém rir?", ironiza Cacá.
Se tudo der certo -leia-se, se eles conseguirem o patrocínio- "Scapino" deve estrear em janeiro do ano 2000. Pelo menos até lá, Cacá Rosset terá o que fazer e não precisará mais colocar anúncios no jornal à procura de emprego, como fez em janeiro passado, na Folha: "Recebi três telefonemas como resposta. Um rapaz me ofereceu emprego de apresentador de shows de striptease, nos intervalos das sessões de cinema na rua Aurora; uma senhora que me consolou disse que a vida é feita de altos e baixos e que, se precisasse, poderia jantar na casa dela. E outro que falou que teatro era coisa de veado e me mandou ir para aquele lugar", conta o diretor e ator.
Ainda sobre "Scapino", Cacá tem um último aviso para os fãs: "Se não me internarem antes, a peça sai".


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