São Paulo, terça, 15 de dezembro de 1998

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AMOR NOS TEMPOS DO POP
"Não precisamos crescer', diz Nick Hornby

da Reportagem Local

Leia a entrevista do escritor Nick Hornby, concedida à Folha, por fax, de Londres. (PATRICIA DECIA)

Folha - O que o levou a escrever um livro como "Alta Fidelidade"?
Nick Hornby -
Sempre li, e continuo lendo, muitos livros escritos por mulheres sobre as relações contemporâneas. Percebi que havia pouquíssimos livros assim partindo de um ponto de vista masculino. Quis mexer nessa balança.
Folha - Muito já foi dito sobre esse "novo homem", menos autoconfiante e um tanto perdido. Rob Fleming é um personagem representativo disso?
Hornby -
Sim, acho que Rob é representativo sob vários aspectos. Acho que nós tivemos muito mais escolhas comparados à geração de nossos pais e é muito fácil ficarmos paralisados por elas. Rob é confuso em seus relacionamentos, em seu trabalho, pelo fato de suas namoradas serem muito mais bem-sucedidas do que ele. Todos esses conflitos são relativamente novos.
Folha - Seu mais recente livro, "About a Boy", discute a adolescência e, em "Alta Fidelidade", seus personagens se encaixam na idéia de "adultescente". O que acha desse prolongamento da adolescência na vida adulta?
Hornby -
O que eu diria é que a vida moderna traz maneiras de esticar a adolescência até os 30, ou até um pouco mais. Como não precisamos decidir sobre as coisas muito rápido -podemos ter filhos e escolher a carreira mais tarde-, não precisamos crescer.
Folha - Qual o maior problema e a principal vantagem de escrever uma ficção que acontece aqui e agora e é cheia de referências à cultura pop?
Hornby -
O problema, acho, é que o trabalho vai parecer datado em 20 ou 30 anos. E, devo dizer, isso não me preocupa. Sei que preocupa alguns escritores que estão de olho na posteridade, mas eu prefiro ser lido agora do que daqui a cem anos. A vantagem é que você pode datar e situar muito precisamente o que está acontecendo, num contexto cultural. Sei que julgo as pessoas pelo que elas lêem, assistem, ouvem e vestem, e tenho certeza de que outras pessoas também o fazem. Então, quis poder transpor isso para meus escritos.
Folha - Todas as referências em "Alta Fidelidade" são suas?
Hornby -
Algumas sim, outras não. Os livros favoritos de Rob, por exemplo: li todos e gosto deles, mas nunca estariam na minha lista de top five. Eu os escolhi para refletir o caráter do personagem.
Folha - O fato de você ter trabalhado na imprensa influenciou o modo como você escreve ou os temas que escolhe?
Hornby -
Na verdade, a maior parte do meu trabalho como jornalista foi resenhando livros e isso não me influenciou muito. A única coisa que eu diria é que "Fever Pitch" consiste de várias resenhas agrupadas, o que, suponho, reflete uma certa falta de confiança, naquela época, em ser capaz de escrever um livro inteiro.
Folha - Você é retratado como um outsider, antes da fama. O que acha desse "personagem"?
Hornby -
Acho que todos os meus livros são sobre pertencer a uma comunidade. Nunca me senti outsider, porque meus interesses me ajudam a fazer amigos rapidamente. Estou mais interessado em como as pessoas se relacionam.
Folha - Você ficou milionário. Mudou a forma como você se vê?
Hornby -
Nada mudou, na verdade, apesar de agora eu poder fazer exatamente o que quero em termos profissionais -e acho que posso não fazer nada, se estiver a fim. Mas não quero ficar parado.
Folha - Na lista de seus autores favoritos há apenas escritores de língua inglesa e nenhum poeta. Qual o motivo?
Hornby -
Não consigo ler traduções -é muito difícil ler uma tradução e sentir que você está lendo as próprias palavras do escritor. Não acredito fazer parte de uma tradição literária britânica, especificamente. Acho que o mundo mudou. Vejo filmes americanos, leio livros americanos, ouço música francesa, assisto a televisão inglesa... Sou um produto disso tudo, como todo mundo é agora.
Folha - Os britânicos estão sempre à procura da nova tendência, das bandas, livros e filmes mais novos e "cool" possível. Como é escrever nesse clima?
Hornby -
Amedrontador! Acho que meus livros são mais calorosos do que "cool", o que significa que eles têm uma relação difícil com gente "cool". A coisa mais difícil de estar na moda é a inevitável consciência de que você vai ficar fora da moda em algum momento.
Folha - Você já está escrevendo um novo livro?
Hornby -
Estou trabalhando em dois roteiros, no momento, para cineastas ingleses. Um é uma comédia romântica, o outro, um pouco mais depressivo. Provavelmente não começarei a escrever outro livro até o ano que vem.
Folha - Você vendeu os direitos de filmagem de "About a Boy" para o Robert De Niro. E "Fever Pitch" já virou filme. E quanto a "Alta Fidelidade"?
Hornby -
"Alta Fidelidade" vai ser filmado em 99, em Chicago. Será dirigido por Stephen Frears e estrelado por John Cusack.



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