São Paulo, terça, 15 de dezembro de 1998

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DISCO LANÇAMENTOS
Brian Wilson diz que ainda está em 1966

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

O homem-mito está de volta. Nos últimos dez anos, Brian Wilson, 56, pareceu deixar de ser um personagem real, recolhendo-se e passando a assistir de longe ao sempre crescente culto a sua figura enquanto líder da banda pop sessentista Beach Boys.
Agora, volta com "Imagination", primeiro álbum solo de canções inéditas em dez anos. É, por enquanto, mais um soluço de uma carreira fincada na instabilidade.
Líder desde 1961 da mais famosa banda de surf music da história, Brian cometeu em 1966 o álbum "Pet Sounds", que inspirou o "Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band" (67) dos Beatles e hoje carrega status de lenda no cenário pop.
Nas ressaca de "Pet Sounds", a combinação entre instabilidade emocional e uso desenfreado de drogas levou os Beach Boys a uma carreira para sempre inconstante.
Em 1988, houve o soluço solo de Brian. Seu primeiro disco, "Brian Wilson", causou espécie por razões extramusicais: foi produzido e composto em parceria com Eugene Landy, psiquiatra de Brian, que clamava ter resolvido os problemas psicológicos do artista.
Em meio a disputas entre terapeuta e família e a persistente instabilidade, Brian se recolheu novamente. Lançou, em 95, "I Just Wasn't Made for These Times" -um álbum só de regravações.
Em entrevista por escrito à Folha, Brian Wilson falou sobre a volta com "Imagination" e admitiu que se mantém atado ao ápice de 1966. "Ainda estou em "Pet Sounds', com todo aquele amor."
Folha - Por que você ficou dez anos sem lançar canções inéditas?
Brian Wilson -
Fiquei tão machucado por meu primeiro disco não ter vendido que me desliguei. Mas estive sempre escrevendo canções. Quando decidi fazer um novo álbum, não usei nenhuma dessas canções antigas que escrevi. Eu guardei-as. Elas podem ser gravadas um dia, porque são canções rock. Rock'n'roll faz bem à alma.
Folha - Como você definiria o disco "Imagination"?
Wilson -
Como uma coleção de canções espirituais de amor.
Folha - Em texto que acompanha o CD, você diz: "É como se eu visse alguma luz. As coisas fazem sentido para mim novamente". Elas haviam perdido o sentido?
Wilson -
Às vezes, atravesso períodos em que penso que ninguém se importa comigo. Vou ao piano e componho. Tenho muita música em minha alma, mais do que eu jamais poderia exteriorizar.
Quando minha alma precisa se expressar, vou para o piano. Passei por muita coisa ruim. Agora casei, e adotamos duas crianças. Minha vida se alegrou, se renovou.
Folha - Por que você opta por fazer quase todos os backing vocals?
Wilson -
Para que o disco soasse como uma pequena coleção de canções vindas de um mesmo lugar, um lugarzinho chamado Brian Wilson. Ele representa o meu amor.
Folha - O som que você criava com os Beach Boys ainda faz sentido à beira do século 21?
Wilson -
Não, as novas canções não são contemporâneas. Estão um pouquinho fora de época, mas vêm do coração. Minha música é um pouco antiquada hoje em dia, e estou orgulhoso de dizer isso. O modo como canto está fora de moda. E, é claro, o amor está fora de moda. A música de hoje não tem muito amor. Ainda estou em "Pet Sounds", com todo aquele amor.
Folha - Você é considerado um gênio por muitos artistas e críticos. O que você pensa disso? Influencia seu modo de trabalhar?
Wilson -
Fico honrado que as pessoas pensem que sou um gênio. Quando fiz "Pet Sounds", as pessoas disseram que eu era um gênio. Me considerei um gênio pelo modo delicado como criava música. Ser chamado de gênio me afeta, sim. Me dá confiança em minha habilidade de compor. O lado mau é que você tem que sobreviver a isso.
É sabido que você teve muitas experiências com drogas. Como elas influenciaram -ou determinaram- o curso de sua carreira?
Wilson -
Elas não influenciaram o desenvolvimento de minha carreira. Só me fizeram mais consciente ao cantar. Me forçaram a vasculhar minha alma. Eu não gostava de drogas. Fodam-se as drogas. Me fizeram medroso da vida e das pessoas. Me forcei a sair delas. Não use drogas. Quem precisa delas, afinal? Tudo que fazem é torná-lo paranóico. Seja natural.



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