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CINEMA
Francês exibe "Laissez-Passer" e leva mensagem de apoio aos argentinos
Crise leva Tavernier a Mar del Plata
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A MAR DEL PLATA
Certo de que o 17º Festival Internacional de Cinema de Mar del
Plata "enfrentaria momentos difíceis", em razão da crise argentina
-e por isso mesmo-, o diretor
francês Bertrand Tavernier, 60,
decidiu aceitar o convite para participar da mostra que se encerra
hoje, exibindo fora de concurso
"Laisser-Passer".
"Eu havia sido convidado outras vezes, mas penso que é em
ocasiões como esta, e não nas especialmente boas, que se deve
participar", disse.
Com "Laisser-Passer", Tavernier quis fazer o exercício de
transportar-se para outro tempo
(os anos 40, da ocupação alemã
na França, durante a Segunda
Guerra), como forma de testar hipoteticamente convicções éticas e
respostas comportamentais, além
de render homenagem a um de
seus ídolos -o roteirista Jean Aurenche.
"Queria perguntar a mim mesmo o que eu faria nessa situação",
diz, referindo-se ao foco e ao pano
de fundo do filme: a produção cinematográfica do período, realçada nas figuras de Aurenche e do
diretor Jean Devaivre, em cujo livro de memórias o roteiro do filme se baseia.
Devaivre é um dos profissionais
que durante a ocupação estiveram a serviço do estúdio Continental, de origem alemã, mas instalado na França. As atividades do
estúdio eram supervisionadas por
Goebbels, o chefe da propaganda
nazista.
"Goebbels era um homem com
idéias muito inteligentes sobre o
cinema. Recomendava à Continental que não realizasse filmes
demasiadamente nacionalistas,
mas sim fitas de diversão, nulas
em conteúdo, que fizessem os
franceses dormir", diz Tavernier.
O que fascina o diretor é "o
inexplicável da existência de certas ordens que não se cumprem
durante a guerra" e o fato de que o
período nazista tenha sido profícuo em "obras-primas". ""O Corvo" (1943), de Henri Georges
Clouzot pode ser tudo, menos um
filme sem conteúdo."
O título "Laisser-Passer" (Deixar Passar), que pretende remeter
à superação do período em que a
Franca esteve subjugada, não é
exatamente do agrado do diretor.
"Nunca estive totalmente satisfeito com ele." Mas foi mantido "por
insistência do distribuidor francês e à falta de outro melhor", diz.
Já a crítica francesa encontrou no
filme muito mais reparos a fazer.
Reprova-se a "defesa de uma concepção clássica de cinema" e uma
excessiva condescendência com
os colaboracionistas. "Isso é falso,
idiota e absurdo", disse Tavernier.
"Não pretendi dar nenhuma lição dogmática sobre cinema. O
filme não defende uma forma de
cinema, mas sim gente que tenta
lutar. Esse tipo de interpretação é
típico de gente incapaz de compreender que podemos fazer um
filme sobre pessoas completamente diferentes de nós."
Tavernier argumenta que embora seu filme se debruce sobre o
cinema clássico -"O único que
se fazia àquela época"- "foi filmado num estilo totalmente
oposto ao dos anos 40 e está muito mais influenciado por diretores
contemporâneos, como Robert
Altman". "Se você puder me
apontar, entre a produção dos
anos 40, um filme cujos protagonistas não se encontram em uma
única cena, será um achado sensacional para todas as cinematecas do mundo."
O cineasta diz que "Laisser-Passer" "nega completamente essa
construção narrativa que conduz
a uma apoteose dramática, o clímax, característico de todos os filmes da época".
Tavernier é um dos convidados
para a cerimônia de encerramento do Festival de Mar del Plata, esta noite, quando será entregue o
troféu Ombú de Ouro ao melhor
filme da competição e exibido o
longa argentino "La Soledad Era
Eso" (A Solidão Era Isso), de Sergio Rénan.
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