São Paulo, segunda, 16 de março de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTES PLÁSTICAS
Retrospectiva do escultor segue para o Jewish Museum de NY, em junho, e para Miami em dezembro
George Segal exibe "magia do cotidiano"

do USA Today

George Segal é um homem pensativo que demora muito a responder uma pergunta. Ele leva a mão à boca, inclina a cabeça e olha ao longe pelo que parece ser uma eternidade. Pode-se quase ouvir sua cuidadosa resposta se formando em seu cérebro.
É mais rápido simplesmente olhar o trabalho de Segal a fim de descobrir o que ele está pensando, e por mais de 40 anos foi exatamente isso que fizeram os norte-americanos. Suas esculturas de gesso branco sobre pessoas cuidando do que ele chama de "a magia do cotidiano" tornaram-se trabalhos básicos da arte moderna: o homem solitário sentado ao balcão de almoço; um viajante solitário no metrô indo para casa; os cinco homens numa fila de pão na era da Grande Depressão.
²Em Washington, uma retrospectiva com 62 peças cobrindo quatro décadas do trabalho de Segal ocupa o Hirshhorn Museum and Sculpture Garden da Smithsonian Institution.
²Primeira retrospectiva de Segal nos Estados Unidos em 20 anos, a mostra depois segue para o Jewish Museum de Nova York (14 de junho) e para o Museu de Arte de Miami (17 de dezembro).
²Vestindo jeans e tênis, Segal vagueia por sua exposição como se fosse apenas um dos trabalhadores da equipe de instalação.
²Alguns dizem que sua força como artista vem sendo o fato de que ele nunca perdeu a ligação com o homem comum. Ele é uma companhia agradável, rindo com facilidade e repetidamente; tocando o braço de um desconhecido durante uma conversa.
²"Sempre acreditei na validade da vida cotidiana", diz. "Estive sempre convencido de que a matéria e o espírito não podem ser separados, e o mesmo vale para o visível e o invisível. Alguns descartam a vida cotidiana como banal e de baixa espiritualidade, mas eu nunca acreditei nisso."
²Segal, famoso por envolver seus modelos em camadas finas de algodão embebidas em gesso para criar moldes ocos de escultura, descobriu muito cedo que, ao envolver o corpo físico, capturava o espírito de uma pessoa, igualmente.
²"O que ainda me espanta é que os atributos internos de um modelo se destaquem", diz. "Não fosse assim, teria abandonado esse método há muito tempo."
²"Registrar o físico expressa aquilo que não é visível."
²Segal, aos 72, está bem consciente de que avançou muito, de criador de galinhas em Nova Jersey a artista batalhador e, depois, escultor celebrado, astro de uma individual no Smithsonian.
²Sua arte já foi imortalizada com a instalação de três peças no Memorial de Franklin Delano Roosevelt, na Tidal Basin, não longe do Hirshhorn.
²Ele diz ter ficado agradavelmente surpreso com o fato de que suas esculturas públicas, entre as quais a famosa "Fila de Pão na Depressão", tenham sido tão bem recebidas.
²"A única coisa que posso supor é a fome de muitas pessoas pelas atitudes ali expressas", diz. "Eu estava tentando conectar as imagens com as palavras de Roosevelt.... ele falava com tanta eloquência sobre a compaixão pelas pessoas comuns."
²Desde que o memorial foi inaugurado, em maio passado, milhares de pessoas comuns tiraram fotos ao lado das esculturas de Segal, especialmente dos cinco homens na fila de pão da Grande Depressão.
²Ele está satisfeito com isso: "Construí as peças como espaços nos quais se pode entrar e caminhar. Elas foram pensadas para serem vistas de múltiplas direções".
²Segal diz que milhares de imagens atraem sua atenção a cada dia, mas apenas raramente ele vê alguma coisa que queira transformar em escultura. Ele ainda não sabe como ou quando isso acontece.
²Em 1978, ele foi a um shopping center e viu uma mulher perto de um carrinho de cachorro-quente. O que chamou sua atenção foi a cobertura do carrinho. Um desenho de Mondrian.
²"Lembro distintamente daquele dia. Lembrei dos meus dias de estudante de arte, analisando Mondrian e sua grande contribuição para o mundo da arte, e quando vi um padrão criado por ela na cobertura do carrinho de cachorro-quente, não resisti."
²A escultura, chamada "Carrinho de Cachorro-Quente", está na exposição.
²Quando começou a esculpir, Segal era seu próprio modelo. Depois, começou a usar a esposa. Hoje em dia, há muitos voluntários, mas ele continua a usar apenas amigos íntimos e familiares.
²Sua esposa, com quem ele casou há mais de 50 anos, já serviu de modelo mais de 25 vezes.
²"Mas agora ela resiste", diz ele rindo. "Ela não acha que é bonita o bastante hoje em dia."
²Ela e os amigos de Segal sabem por experiência própria que ser modelo não é nada glamouroso.
²No dia em que um de seus amigos foi envolvido no algodão embebido em gesso como um dos homens da fila de pão, era agosto, e fazia calor em Nova Jersey. Ele teve de ficar em pé por horas usando seu sobretudo e chapéu, mas Segal sabia o que estava fazendo. O desconforto e infelicidade do modelo com a situação são perfeitamente visíveis na escultura concluída.
²"É um velho amigo em que muito confio", diz Segal. "Ele simpatizava com o que eu estava tentando dizer com aquela peça. Todos os que trabalharam como modelos ali o fizeram com grande alegria."
²Será que os milhares de pessoas que verão a retrospectiva de Segal também se encantarão com seu trabalho? Uma vez mais, ele pára por um longo tempo antes de responder.
Ele diz não estar certo, acrescentando que reluta em dissecar a visão pessoal de qualquer um quanto ao seu trabalho, em entrar na cabeça dos outros.
"A única coisa que posso esperar é lhes oferecer o meu dom."


Tradução Paulo Migliacci
Mostra: George Segal Onde: Hirshhorn Museum and Sculpture Garden da Smithsonian Institution, Washington Quando: diariamente, das 10h às 17h30min (até amanhã) Quanto: entrada franca


Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.