São Paulo, sábado, 16 de abril de 2011

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CRÍTICA HISTÓRIA

Independência dos EUA mudou o mundo

Obra de David Armitage investiga o legado histórico da declaração separatista esboçada por Thomas Jefferson


O QUE O LIVRO FAZ É ESTABELECER UM PAINEL VARIADO, SEM SE PREOCUPAR EM DISSECAR REVOLTAS, REVELAR OS INTERESSES


ELEONORA DE LUCENA
DE SÃO PAULO

Todos os homens são iguais e têm direitos inalienáveis, como a vida, a liberdade e a busca da felicidade. Se um governo atua para destruir esses princípios, é direito do povo derrubá-lo.
Em torno desses conceitos foi redigida a Declaração da Independência dos Estados Unidos, aprovada em congresso em 4 de julho de 1776.
O texto ganhou o mundo e inspirou documentos similares em vários países.
David Armitage, doutor em história pela Universidade de Princeton e professor em Harvard, se debruçou sobre a declaração esboçada por Thomas Jefferson (1743-1826 ).
Analisou o texto, buscando visões nos campos jurídicos, filosóficos, históricos e linguísticos. Comparou com outros escritos semelhantes feitos em dezenas de países em mais de dois séculos. O resultado é o livro "Declaração de Independência - Uma História Global".
O autor advoga que o documento, mesclando o anúncio da independência, uma declaração de direitos e um manifesto, inaugurou um gênero de literatura política.
O volume tenta trazer um pouco do panorama político e econômico da época, mostrando, por exemplo, o jogo de pressões em torno do rascunho do texto, as repercussões internacionais e as críticas produzidas pelos áulicos do rei britânico.
Monarquistas condenaram o "atrevimento" dos colonos e enxergaram hipocrisia na declaração, pois falava em homens iguais em um país escravocrata.
Era "ridículo" ver, escreveu Thomas Day, abolicionista inglês, "um patriota americano assinando resoluções de independência com uma das mãos e, com a outra, brandindo um açoite sobre seus escravos amedrontados". Contradições que nem a Guerra de Secessão (1861-1865) nem a luta por direitos civis nos anos 1960 aniquilaram integralmente.
Abraham Lincoln (1809-1865) compreendia bem essa dualidade da declaração que, além de proclamar a independência, continha uma mensagem para o futuro, universal e duradoura.
Elogiando Jefferson, Lincoln afirmou, em 1859, que ele tinha tido "a visão e a capacidade de introduzir, em um documento meramente revolucionário, uma verdade abstrata, aplicável a todos os homens e a todas as épocas".
O livro de Armitage não mergulha nas causas da Independência dos EUA e explora pouco os seus antecedentes. No campo político, o papel de Thomas Paine (1737-1809) poderia ter tido mais destaque. Afinal seu livreto "Senso Comum" foi importante na propaganda pelo Estado livre e republicano, sendo a publicação mais vendida na época.
O historiador poderia ter aprofundado mais o contexto da revolta norte-americana e dos movimentos independentistas dos quais trata no livro. A visão de conjunto parece limitada ao movimento de fragmentação de impérios. A dinâmica capitalista que embalou as rebeliões não é abordada.
O que o livro faz mesmo é estabelecer um painel variado, sem se preocupar em dissecar revoltas, revelar os interesses ou construir um pano de fundo mais denso para os movimentos e os documentos que produziram.
Bem interessante é a seção com as íntegras de algumas declarações de independência. Destaque para o texto do Vietnã, de 1945, redigido por Ho Chi Minh (1890-1969), e que parte da consagrada proclamação norte-americana.
Outro documento contundente é o do Haiti, de 1804. A rebelião escrava construiu um manifesto forte, exclamando: "É necessário viver de forma independente, ou morrer. Independência ou morte!". Palavras que entrariam também para a história do Brasil anos depois.

DECLARAÇÃO DE INDEPENDÊNCIA

AUTOR David Armitage
EDITORA Companhia das Letras
TRADUÇÃO Angela Pessoa
QUANTO R$ 43 (264 págs.)
AVALIAÇÃO bom


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