São Paulo, quinta-feira, 16 de maio de 2002

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ARTES CÊNICAS

Coreógrafa estrutura espetáculo em obras de Cildo Meireles, Victor Arruda, Gringo Cardia e Chelpa Ferro

Deborah Colker baila em quatro frentes

Divulgação
Bailarinos da Companhia de Dança Deborah Colker, em ensaio do espetáculo "4 por 4", que estréia amanhã em Porto Alegre e dá início a turnê que passa por Rio e SP


ANA FRANCISCA PONZIO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Entre 1967 e 1969, o artista plástico Cildo Meireles inaugurou nova fase em sua carreira com a obra "Espaços Virtuais: Cantos", que ele considerava datada até ser introduzida por Deborah Colker no novo espetáculo da coreógrafa, "4 por 4", que inicia turnê nacional amanhã, no Teatro Ospa, de Porto Alegre, devendo chegar em julho no Rio e em São Paulo.
Estruturada em madeira, a obra de Meireles, que sugere uma articulação de paredes, marcou o período em que o artista deixou de explorar exclusivamente as imagens planas, resultantes de seu trabalho gráfico. "É completamente novo ver os "Cantos" interagindo com uma coreografia, diante de um público de teatro", diz Meireles, que não "mexia" na obra desde a década de 60.
Os "Cantos" integram espetáculo que, em quatro cenas, procura dialogar com obras de mais três universos distintos das artes visuais brasileiras. Além do pintor Victor Arruda, cuja obra é associada à geração 80, o quarteto de artistas escolhido por Deborah Colker inclui o designer e cenógrafo Gringo Cardia, único que já colaborava com a coreógrafa, e o grupo Chelpa Ferro, que procura dissolver fronteiras artísticas por meio do trabalho conjunto dos artistas plásticos Luiz Zerbini e Barrão, do editor de imagens Sergio Mekler e do produtor musical Chico Neves.
Para Colker, a parceria com os quatro artistas lhe trouxe uma nova abordagem coreográfica. Após enfatizar o espaço aéreo em espetáculos anteriores como a parede de alpinismo de "Velox", a roda-gigante de "Rota" e os andares sobrepostos de "Casa", ela agora busca outras possibilidades na superfície plana do palco.
"Quando comecei a conceber "4 por 4", eu queria encená-lo num galpão, com o público circulando entre as obras, como normalmente ocorre numa exposição de artes plásticas. Mas depois me convenci de que a transposição dessas peças para o palco elizabetano estimularia no público uma percepção fora do habitual", diz Colker.
Com exceção de Meireles, que participa com obra já existente, os demais artistas criaram especialmente para o espetáculo. Depois de "Cantos", que abre "4 por 4", segue a cena "A Mesa", marcada pelo objeto lúdico concebido pelo Chelpa Ferro. Fazendo com que os bailarinos se movam numa confluência de opostos, essa mesa munida de rodas caminha em sentido contrário ao da esteira rolante, colocada em sua superfície.
O gestual cotidiano, sempre presente nas obras de Colker, surge mais intensamente na terceira cena. Intitulada "Povinho", é dançada sobre a pintura gigante que Victor Arruda realizou no linóleo que recobre o palco. "Fiquei surpreso quando Deborah me disse que eu poderia pintar o que quisesse, mesmo conhecendo o meu trabalho, que às vezes é considerado demasiadamente erótico ou agressivo", diz Arruda. "Quando vi o primeiro ensaio com os bailarinos dentro de minha pintura, senti que era um desses momentos em que tudo faz sentido."
"Dentro" da pintura de Arruda, o elenco de Colker assume uma relação escatológica com o corpo. "Entre a inocência e a pornografia, eles descobrem todos os seus buracos, como se estivessem lidando com o que há de secreto no cotidiano", acrescenta a coreógrafa sobre "Povinho", cuja trilha sonora inclui a música-tema da personagem Branca de Neve, "Some Day My Prince Will Come".
O final do espetáculo, quando os bailarinos dançam com extrema concentração entre os 90 vasos da instalação de Gringo Cardia, é introduzido por um preâmbulo dançado por três bailarinas. A música ao vivo é interpretada por Colker. Tocando Mozart ao piano, ela mostra que seus dotes artísticos vão além da coreografia.


4 POR 4. Com: Cia. de Dança Deborah Colker. Onde: Teatro Ospa (av. Independência, 925, RS, 0/xx/51/3311-7944). Quando: amanhã e sábado, às 21h, e domingo, às 19h. Quanto: de R$ 20 a R$ 30. Em São Paulo, teatro Alfa (tel. 0/ xx/11/5693-4000); no Rio, Teatro Municipal (tel. 0/xx/21/2262-3935).



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