São Paulo, Sexta-feira, 16 de Julho de 1999
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NETVOX
Taxar e-mail não é solução

MARIA ERCILIA
Editora de Internet


O novo relatório de desenvolvimento humano da ONU, publicado esta semana, faz um perfil do usuário típico da Internet no mundo inteiro: ele tem menos de 35 anos, diploma universitário, mora num centro urbano e fala inglês. Estão nos EUA 26% dos usuários da Internet.
A leitura do relatório deixa a impressão de um enredo velho, com novos personagens: onde se lia ouro, terra, opressão, agora se lê telecomunicações, conhecimento, patentes, exclusão. As riquezas mudaram de lugar, as fronteiras também, mas o dinheiro continua a fluir na mesma direção por um funil cada vez mais estreito.
As notícias que se seguem são as piores: o mundo está cada vez mais integrado -mas também cada vez mais clara e agudamente dividido. O custo de uma ligação telefônica de três minutos entre Londres e Nova York caiu de US$ 245 em 1930 para US$ 0,35 em 1998. Só que esses benefícios da economia de escala não atingem os mais pobres. Em muitos países da África, o custo médio de uma conexão à Internet é US$ 100, comparado com US$ 20 nos EUA.
Se a Internet tornou possível uma infinita conversa global, os que não têm acesso a ela estão mais silenciosos que nunca, pelo que se pode deduzir do relatório.
Segundo ele, 88% dos usuários da Internet -que seriam 143 milhões em 98-estão em países ricos e industrializados, e 80% dos sites estão em inglês, embora somente uma a cada dez pessoas no mundo fale essa língua.
Um relatório divulgado também nesta semana, nos EUA, tem resultados semelhantes: o número de pessoas conectadas à Internet está crescendo mais rápido entre brancos, com diploma universitário e renda anual acima de US$ 75 mil. Mesmo nos EUA, aumenta o fosso entre os poucos conectados e a maioria desconectada.
Mas o remédio proposto pelos autores do relatório da ONU não podia ser pior: eles imaginam um imposto mundial sobre envio de e-mails. Embora a chance dessa fantasia virar realidade seja quase nula, vale o exercício de discuti-la, porque ela mostra como nossa capacidade de lidar com os novos problemas que estão surgindo precisa de ajustes.
A maior vantagem da comunicação por e-mail é justamente o fato de que ela tem custo fixo. Você paga uma taxa pelo acesso e manda quantos quiser ou puder, independente da distância. Um e-mail para a Vila Madalena ou para o Japão custa a mesma coisa, ou seja, nada (claro que há o custo do equipamento e da linha telefônica, mas o importante aqui é que ele não é proporcional ao número de mensagens).
É bem verdade que a taxa proposta é mínima -US$ 0,1 por cada 100 e-mails. Um imposto sobre cada mensagem, sob o pretexto de estender o uso da Internet aos menos privilegiados, acabaria por tornar o uso do correio eletrônico menos viável, já que os usuários de baixa renda estariam também submetidos a ele e teriam muito mais dificuldade para pagá-lo.
Imagine o pesadelo administrativo de cobrar um imposto mundial sobre e-mails de determinado tamanho e depois transformar esse dinheiro em benefícios para quem realmente precisa deles. Seria uma burocracia sem fim. E nada mais injusto que cobrar um imposto em dólar no mundo inteiro. Nos países onde a moeda é mais desvalorizada, ele seria bem mais caro.
A proposta reflete os dilemas da própria ONU: realiza um trabalho importante, alimenta a mídia e instituições regularmente com relatórios e dados conscienciosamente preparados, mas enfrenta dificuldades em dar conta de problemas sociais cada vez mais complexos.
Não estamos precisando de um novo imposto, administrado por uma entidade mundial. Seria muito mais produtivo criar incentivos fiscais para que empresas invistam nos países em desenvolvimento, por exemplo.
Mesmo assim, para quem se interessa pelo assunto, vale a pena ler o capítulo 2 do estudo no endereço do relatório da ONU: www.undp.org/hdro/99.htm.

Site mostra o tabuleiro de Carmen Miranda
Esgote o assunto Carmen Miranda no site que estréia hoje, assinado pela produtora carioca Estação Web. Além das canções da cantora, há "Carmens" de outros intérpretes, como Caetano, Ney Matogrosso e Paula Toller (www.uol.com.br/carmen)

NOTAS


Design em movimento
O Instituto Cultural Itaú promove no próximo dia 21 o seminário "O Design Gráfico e a Imagem em Movimento", com Rico Lins e Jimmy Leroy, às 21h.
Lins é ilustrador e designer gráfico, com mestrado no Royal College (Londres). Trabalhou em Paris e em Nova York, onde foi diretor de arte da CBS Records.
Jimmy Leroy é gerente do departamento de promos e gráficos da MTV Brasil. O seminário vai discutir o uso de elementos gráficos em vídeo, cinema, CD-ROM e Internet.
Mais informações pelo telefone 0/xx/ 11/210-3057 ou no site www.itaucultural.org.br

Propaganda contra a fome
The Hunger Site (www.thehungersite.com/index.html) é uma nova e criativa forma de anunciar na Internet: um mapa do mundo mostra a probabilidade estatística de alguém estar morrendo de fome neste momento.
Quem quiser clica num botão onde se lê "Doe comida de graça". Ao clicar, vê o anúncio de um patrocinador, que pagará por uma porção de arroz, milho ou trigo em algum país distante. Cada visitante pode fazer uma doação por dia -pouco mais de 400 mil pessoas já o fizeram, até hoje.

Quarto das meninas
É possível que questões de zoneamento encerrem a carreira do site "Voyeur Dorm" -seis garotas que vivem numa casa equipada com 34 câmeras que registram toda a sua vida, em Tampa (Flórida, EUA).
Um órgão de zoneamento afirma que "diversão adulta" é proibida na zona residencial em que elas moram. As moças alegam que todos os seus negócios (cobram uma assinatura de US$ 35 dos visitantes) são conduzidos pela Internet e que nenhum cliente visita a casa (www.voyeurdorm.com/).


E-mail: ercilia@uol.com.br


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