São Paulo, Quinta-feira, 16 de Setembro de 1999
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CINEMA

"Il Dolce Cinema", do diretor norte-americano, encerrou a edição deste ano do festival italiano

Veneza acaba com Scorsese inacabado


AMIR LABAKI
enviado especial a Veneza



Martin Scorsese encerrou o festival de Veneza com a primeira exibição pública de "Il Dolce Cinema". Logo na primeira cena, deixa claro ser um título provisório para uma versão de trabalho.
Exibido aqui com 90 minutos, metade da duração planejada para o projeto acabado, "Il Dolce Cinema" é uma história sentimental de seu cinema italiano. Os primeiros 30 minutos são dedicados às origens familiares da descoberta daqueles filmes.
Os avós do cineasta, tanto do lado paterno quanto materno, trocaram a Sicília italiana pela Nova York do início do século. Aos sábados à noite, já no pós-guerra, assistiam com os filhos, netos e amigos às sessões de cinema italiano na nascente TV americana. "Pela primeira vez descobri de onde eu vinha", diz o cineasta.
"Paisà" (1946), de Rossellini, introduziu o garoto Martin, aos seis anos, ao que mais tarde descobriria se tratar do neo-realismo. "Para mim", confessa Scorsese, "o neo-realismo é o mais precioso momento da história do cinema".
O diretor lembra com nostalgia o contraste entre o escapismo dos faroestes americanos das sessões de cinema e o choque de realidade daqueles filmes na TV aos fins-de-semana. Além do neo-realismo, Scorsese descobriu na sala de seus pais também o cinema épico feito na Itália.
Uma das delícias do documentário é uma sucessão de desenhos feitos por Scorsese quando garoto, à moda de "storyboards", daquelas produções. "The Eternal City" ("A Cidade Eterna") intitulava-se seu épico de papel.
Nessa versão provisória, "Il Dolce Cinema" sobrevoa o cinema de Alessandro Blasetti e apenas cita o pioneiro "Cabiria" (1914), de Giovanni Pastrone. O coração do filme, e de Scorsese, é decididamente neo-realista.
Empenhado em apresentar esta produção às novas gerações, Scorsese recorre a trechos muito mais longos de filmes do que os que utilizara no similar "Uma Viagem Pessoal Pelo Cinema Americano" (1995). Ainda assim, o projeto total vai apresentar imagens de 130 filmes. O foco está no período entre a explosão neo-realista e a revelação de Scorsese como cineasta, isto é, grosso modo, de 1945 ao início dos anos 70.
Roberto Rossellini (1906-77) é o rei de "Il Dolce Cinema". Sua carreira é apresentada em detalhes, dividida em três grandes fases: a neo-realista ("Roma, Cidade Aberta" e "Paisà", o preferido de Scorsese), a fase modernista com Ingrid Bergman ("Viagem à Itália" e "Stromboli") e a radicalização experimental dos últimos anos ("A Chegada ao Poder de Luis 14"). "Rossellini é dos poucos cineastas a ousar mais quanto mais envelhece", afirma Scorsese.
Michelangelo Antonioni é outra paixão evidente. Scorsese contrapõe "A Doce Vida" (1960), de Fellini, à "A Aventura" (1959), de Antonioni. "Gostei do primeiro, mas fiquei chocado com o segundo", afirma. ""A Aventura" foi um ponto de virada em minha experiência com o cinema."
O resumo se encerra com uma homenagem às comédias de Vittorio De Sica, que já citara anteriormente na seção neo-realista com "Ladrões de Bicicletas" (1948). Scorsese relembra o prazer infantil de ver e rever Sophia Loren e De Sica na comédia "O Ouro de Nápoles" (1954).
Na conclusão, Scorsese afirmou que vários outros cineastas estarão na versão integral, num arco que vai da era muda de Pastrone ("Cabiria") à geração dos anos 70, de Lina Wertmüeller e dos Taviani, passando por Rosi, Pontecorvo, Bertolucci e Leone. Recusou-se a fazer previsões de data de lançamento da versão definitiva.


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