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São Paulo, terça-feira, 16 de setembro de 2003

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Pesquisa para o livro levou cinco anos

ARTICULISTA DA FOLHA

O jornalista Samarone Lima, que vive em Recife, gastou cinco anos para elaborar "Clamor - A Vitória de uma Conspiração Brasileira", numa pesquisa que incluiu viagens ao Chile, Uruguai e Argentina. O livro teve origem em seu projeto de mestrado na Universidade de São Paulo (USP).
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
 

Folha - O caso Anatole e Vicky é o mais simbólico do Clamor?
Samarone Lima -
Com certeza. Temos três países envolvidos: Uruguai, Argentina e Chile. Ficou explícito, em 1979, a articulação dos militares. Foi um marco porque misturou ousadia, coragem, perspicácia e sorte. Um grupinho de três pessoas conseguiu encontrar duas crianças desaparecidas três anos antes e dizer ao mundo que as ditaduras estavam atingindo também as crianças.

Folha - Como foi o contato que você teve com os irmãos?
Lima -
A busca de Anatole e Vicky foi um dos maiores desafios. Passei cinco dias em Valparaíso e não conseguia contatos. Falei com Anatole somente quando já estava jogando a toalha. Consegui seu celular, e quando ele atendeu e disse: "Olá, é Anatole", fiquei mudo, entre emocionado e perplexo. Ele é uma pessoa amável e que parece estar muito bem com a vida. Tentei falar com a Vicky, mas quem atendeu foi a mãe adotiva. Explicou que a filha fica incomodada ao falar no assunto, e preferi poupá-la.

Folha - O regime brasileiro sabia da existência do Clamor?
Lima -
Encontrei registros de agentes do Dops acompanhando mobilizações do Clamor, mas era mais aquela coisa ridícula, no final da ditadura, de agentes que queriam mostrar serviço. Preferi nem colocar no livro. O detalhe foi o tempo: no Brasil, a ditadura começava sua transição para o fim. Nos países vizinhos, a noite do terror estava no meio. O Clamor surgiu no momento certo.

Folha - A importância da Cúria na resistência foi crucial?
Lima -
A Cúria foi o coração da resistência civil contra a ditadura. Dom Paulo tinha uma sabedoria impressionante, estimulava a formação de quadros e delegava poderes às pessoas certas. O Clamor foi o primeiro grupo de direitos humanos da América do Sul a fazer a listagem oficial de desaparecidos na Argentina.

Folha - As crianças desaparecidas marcaram a trajetória do Clamor?
Lima -
Há um caso muito triste, que é o de Mariana Zaffaroni. Ela foi sequestrada em 1976, junto com os pais, quando tinha três meses, e foi encontrada quando já era uma pré-adolescente. Foi criada por um integrante da repressão Argentina e ganhou um novo nome. Mariana recusou-se a usar seu nome real e encontrar a avó. Afirmava que ela era uma "bruxa louca", como os militares diziam.

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