|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Pesquisa para o livro levou cinco anos
ARTICULISTA DA FOLHA
O jornalista Samarone Lima,
que vive em Recife, gastou cinco
anos para elaborar "Clamor - A
Vitória de uma Conspiração Brasileira", numa pesquisa que incluiu viagens ao Chile, Uruguai e
Argentina. O livro teve origem em
seu projeto de mestrado na Universidade de São Paulo (USP).
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
Folha - O caso Anatole e Vicky é o
mais simbólico do Clamor?
Samarone Lima - Com certeza.
Temos três países envolvidos:
Uruguai, Argentina e Chile. Ficou
explícito, em 1979, a articulação
dos militares. Foi um marco porque misturou ousadia, coragem,
perspicácia e sorte. Um grupinho
de três pessoas conseguiu encontrar duas crianças desaparecidas
três anos antes e dizer ao mundo
que as ditaduras estavam atingindo também as crianças.
Folha - Como foi o contato que
você teve com os irmãos?
Lima - A busca de Anatole e
Vicky foi um dos maiores desafios. Passei cinco dias em Valparaíso e não conseguia contatos.
Falei com Anatole somente quando já estava jogando a toalha.
Consegui seu celular, e quando ele
atendeu e disse: "Olá, é Anatole",
fiquei mudo, entre emocionado e
perplexo. Ele é uma pessoa amável e que parece estar muito bem
com a vida. Tentei falar com a
Vicky, mas quem atendeu foi a
mãe adotiva. Explicou que a filha
fica incomodada ao falar no assunto, e preferi poupá-la.
Folha - O regime brasileiro sabia
da existência do Clamor?
Lima - Encontrei registros de
agentes do Dops acompanhando
mobilizações do Clamor, mas era
mais aquela coisa ridícula, no final da ditadura, de agentes que
queriam mostrar serviço. Preferi
nem colocar no livro. O detalhe
foi o tempo: no Brasil, a ditadura
começava sua transição para o
fim. Nos países vizinhos, a noite
do terror estava no meio. O Clamor surgiu no momento certo.
Folha - A importância da Cúria na
resistência foi crucial?
Lima - A Cúria foi o coração da
resistência civil contra a ditadura.
Dom Paulo tinha uma sabedoria
impressionante, estimulava a formação de quadros e delegava poderes às pessoas certas. O Clamor
foi o primeiro grupo de direitos
humanos da América do Sul a fazer a listagem oficial de desaparecidos na Argentina.
Folha - As crianças desaparecidas
marcaram a trajetória do Clamor?
Lima - Há um caso muito triste,
que é o de Mariana Zaffaroni. Ela
foi sequestrada em 1976, junto
com os pais, quando tinha três
meses, e foi encontrada quando já
era uma pré-adolescente. Foi criada por um integrante da repressão Argentina e ganhou um novo
nome. Mariana recusou-se a usar
seu nome real e encontrar a avó.
Afirmava que ela era uma "bruxa
louca", como os militares diziam.
Texto Anterior: Trecho Próximo Texto: Artigo: Como desbundar uma ópera Índice
|