|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MÚSICA
Em "Sabotador de Satélite", paraibano trabalha com o produtor Kassin e inova ao abraçar o modelo Creative Commons
Totonho reveste carimbó com eletrônica
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
As composições de Totonho, o
cabeça de Totonho e Os Cabra,
são cheias de humor, mas ele não
brinca quando fala o que quer
com elas: "Eu pleiteio um lugar de
música original no Brasil".
Apesar do tom cavaleiro solitário, quase bravateiro, da afirmação, pode-se dizer que esse paraibano radicado no Rio está cumprindo seu sonho. Cativou parte
da crítica e do público nacional
(5.000 cópias vendidas) e europeu
(9.000 cópias) com seu primeiro
CD, de 2001, e radicaliza mais suas
experimentações no novo "Sabotador de Satélite".
Radicaliza ao fazer um disco
que é, ao mesmo tempo, todo eletrônico -com programações do
produtor Kassin, onipresente nos
estúdios brasileiros, e seu parceiro Berna Ceppas- e todo tradicional, baseado em ritmos como o
carimbó, o coco, a ciranda e a catira.
"É um dos mais profundos discos de música tradicional do Brasil. Sei de onde sai cada som. Eu
não fugiria de uma discussão com
o [José Ramos] Tinhorão", diz ele,
referindo-se ao crítico que é profundo conhecedor das tradições
musicais do país e que rechaça as
interferências externas.
"Mas tradição é o que consegue
ser aceito no seu tempo. Não vou
reproduzir uma quadrilha para
meia dúzia de puristas. O tempo é
outro", afirma Totonho, que diz
querer "experimentar para as
massas".
Ele também radicaliza ao lançar
o que ele e a gravadora Trama garantem ser o primeiro disco brasileiro em modelo Creative Commons. Traduzindo: quem tiver o
programa no computador poderá
abrir os canais do CD e usá-los como bem entender, sem ter de pagar direitos autorais.
"Está tudo livre. Faz parte do
pacote de experimentos que eu
pretendo fazer. Se não consigo ganhar dinheiro, pelo menos me divirto. Acho que esse é um ato de
sabotador", acredita.
Música eletrônica
"Sabotador de Satélite" também
é radical em relação ao anterior
"Totonho e Os Cabra" porque,
agora, a eletrônica está da primeira à 12ª faixa. "Eu e Kassin decidimos zerar o sample e a harmonia", diz ele, que aboliu tanto as
fusões quanto os violões e pianos
que servem como base harmônica de arranjos.
"Eu punha primeiro a minha
voz limpa. Depois entravam os
beats [batidas eletrônicas], e aí eu
começava a estragar", ironiza ele,
referindo-se aos efeitos que criou
no disco com a voz.
Mas Totonho diz não querer saber de house, trance e outras correntes internacionais. "Estou
atrás de uma música eletrônica
brasileira", afirma. Ele quer, portanto, usar ritmos tradicionais em
um aparato contemporâneo.
"Eu podia fazer discos de baladas, voz e violão. Mas quero criar
uma música do meu tempo. Não
vou fazer o que Gil, Chico e Caetano já fizeram", diferencia-se.
Totonho lançará o CD no Rio,
no dia 27, em uma blitz que está
chamando de "Pega ratão": cantará, entre outros lugares, na Colônia Juliano Moreira [de doentes
psiquiátricos], em uma associação de catadores de papel e para
as prostitutas da Vila Mimosa.
Em outro dia, fará um show que
não reproduzirá o disco, pois os
músicos improvisarão tudo. "Não
admito me copiar", garante ele,
que pretende lançar mais dois
CDs até o meio do próximo ano.
Como diz, seu lugar é mais ao lado dos sabotados do que dos sabotadores.
Totonho é coordenador, há 16
anos, da ONG Ex-Cola, que retira
adolescentes das ruas e procura
encaminhá-los profissionalmente. Na rádio Madame Satã, ligada
à ONG, faz programas de rádio,
dá aulas de informática, música e
outros temas e ouve novidades de
hip hop e eletrônica que não chegam à grande mídia.
"A gente dá um toque nos garotos, porque não dá para saber onde fica Bancoc [na Tailândia] e
não conhecer Belfort Roxo [na
Baixada Fluminense]", conta ele,
um pé no chão e outro na Lua,
uma das protagonistas de suas
composições.
Texto Anterior: Festival Cultura termina com vaias Próximo Texto: Crítica: Camisa-de-força impede vôos mais livres Índice
|