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"Traição' conquista o público
do enviado a Brasília
O longa-metragem "Traição",
dividido em três episódios baseados em histórias de Nelson Rodrigues, arrebatou o público do festival de Brasília, anteontem à noite.
O filme, dirigido por Arthur Fontes, Claudio Torres e José Henrique Fonseca -todos estreantes
em longa-, foi aplaudido diversas
vezes durante a projeção e efusivamente ao final.
Primeiro filme de cinema realizado pela produtora carioca Conspiração Filmes -que até agora só
tinha produzido comerciais e videoclipes-, "Traição" conta três
histórias de triângulos amorosos,
extraídas dos textos curtos da série
"A Vida Como Ela É".
O primeiro episódio, "Primeiro
Pecado", dirigido por Arthur Fontes, é uma comédia de costumes
ambientada nos anos 50. Conta o
caso entre um jovem tímido e nervoso (Paulo Cardoso) e uma mulher ousada e "casadíssima" (Fernanda Torres), narrada do ponto
de vista das conversas machistas
de botequim.
Com uma luminosidade delicada
e nostálgica (a fotografia é de Affonso Beato), o filme é um primor
de sutileza e economia narrativa.
Tem pelo menos um momento
antológico: ao mesmo tempo em
que vai finalmente para a cama
com a amante, o protagonista se
imagina festejado pelos amigos na
mesa de bar, como se tivesse conquistado um campeonato.
É difícil imaginar uma tradução
mais perfeita do "machismo cordial" brasileiro.
A leveza de "Primeiro Pecado"
cede lugar à atmosfera saturada,
quase gótica, do segundo episódio,
"Diabólica", dirigido por Claudio
Torres (filho de Fernanda Montenegro e Fernando Torres).
Nos anos 60, às vésperas de casar
com sua noiva Dagmar (Fernanda
Torres), Geraldo (Daniel Dantas) é
seduzido pela cunhadinha de 13
anos, Alicinha (Ludmila Dayer). O
triângulo acaba de forma trágica.
O episódio, que pode ser definido como uma fantasia macabra, é
talvez o que mais se aproxima do
universo hiperbólico de Nelson
Rodrigues, em que se fundem às
vezes numa única cena o grotesco e
o sublime, o trágico e o cômico.
Foi também o segmento que
mais mexeu com o público, que
aplaudiu entusiasticamente a sequência final, dominada por uma
soberba Fernanda Montenegro
-a grande figura da noite, ovacionada antes (quando subiu ao palco), durante e depois da sessão.
O último episódio, "Cachorro!",
dirigido por José Henrique Fonseca (filho do escritor Rubem Fonseca), ambienta-se nos brutais e cínicos anos 90, e o seu tom é de um hiper-realismo quase tarantinesco,
beirando em alguns momentos o
teatro do absurdo.
Num hotelzinho de terceira, o
marido traído e armado (Alexandre Borges) confronta-se com a
mulher (Drica Moraes) e o amante
(José Henrique Fonseca), submetendo-os a uma tortura física e psicológica enquanto passa em revista o relacionamento entre os três.
É uma mistura eficaz dos paroxismos morais de Nelson Rodrigues com a brutalidade de Rubem
Fonseca.
(JGC)
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