São Paulo, terça-feira, 16 de novembro de 2004

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Exposição celebra 90 anos de ativista

Roberto Price/Folha Imagem
O professor Abdias Nascimento no bairro da Glória, no Rio, com sua mulher, Elisa, ao fundo


DA SUCURSAL DO RIO

Chamado na enciclopédia do discípulo Nei Lopes de "a mais longeva e importante liderança negra do Brasil", Abdias Nascimento começou a desenvolver sua consciência política ainda criança, quando ouvia de sua mãe, em Franca (SP), que não podia aceitar ser desrespeitado por ser negro.
Foi isso o que fez no Exército, em cinemas e hotéis onde era barrado com outros negros e em todos os momentos de sua vida em que se sentiu discriminado. Essa postura, somada ao combate às ditaduras do Estado Novo e militar, lhe custou várias prisões e um exílio de dez anos (1968-1978) nos Estados Unidos.
"O exílio foi um prêmio. Pude ser lá o que nunca fui aqui: professor universitário", orgulha-se ele, que deu aulas de cultura afro-brasileira em universidades como Yale e Wesleyan.

Artista plástico
Foi também no exílio que ele deslanchou sua porção artista plástico. Várias de suas telas (quase todas com temas de origem africana) estão no conjunto de 55 trabalhos seus que fazem parte da mostra "Abdias Nascimento, 90 Anos - Memória Viva".
A exposição também conta com obras do acervo do Museu de Arte Negra -de Iberê Camargo, Ivan Serpa, Fayga Ostrower, entre outros nomes.
Idealizado em 1968 e inviabilizado no mesmo ano por causa do AI-5, o museu nunca ganhou uma sede. Era um desdobramento do Teatro Experimental do Negro, criado por Abdias em 1944, depois que ele viu no Peru uma montagem de "O Imperador Jones", de Eugene O'Neill, com um ator branco pintado de preto. Foi para Abdias que Nelson Rodrigues escreveu "Anjo Negro".
Nos anos 80 e 90, ele ainda foi deputado federal e senador pelo PDT-RJ. "Nunca passou uma lei minha. Eles [os parlamentares] achavam que não havia racismo no Brasil, então não havia necessidade das leis", recorda.
Também contando com um colóquio internacional e um ciclo de filmes, o evento que começa hoje no Arquivo Nacional retrata, para Abdias, "vários 90 anos, toda uma vida de luta". Uma luta que ele considera vitoriosa, mesmo que "a verdadeira igualdade ainda esteja muito longe".
Embora acompanhe o trabalho de Elisa Larkin no Ipeafro (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros), ele já não milita mais na linha de frente. "Já dei a minha contribuição", diz.
(LFV)


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