|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
500 ANOS
Obra de Ana Belluzzo é resultado de uma pesquisa acadêmica de três anos desenvolvida na USP
Brasil visto pelos viajantes sai em livro
ROGÉRIO EDUARDO ALVES
da Redação
Uma significativa amostra
da vasta iconografia produzida pelos primeiros viajantes
que aportaram em terras brasileiras está reunida no livro "O Brasil
dos Viajantes", lançado este mês
pela editora Objetiva/Metalivros.
O trabalho é resultado de uma
pesquisa de três anos coordenada
pela professora de história da arte
da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo (FAU) da USP Ana
Maria de Moraes Belluzzo.
A idéia foi recolher as impressões dos primeiros viajantes que
chegavam a uma terra estranha,
entre os séculos 16 e 19, e representaram-na pelo filtro da cultura
européia.
Como escreve Belluzzo na introdução do volume: "Fomos vistos, não nos fizemos visíveis. Não
nos pensamos, mas fomos pensados. A contribuição dos viajantes
forja uma possível memória do
passado colonial e povoa nosso
inconsciente".
Olhar
Não foi sempre que o viajante
registrou com gravuras e pinturas
o que vivia. Muitas das representações do Novo Mundo foram
realizadas com base na literatura
de viagem que os primeiros que
aqui chegaram produziram.
Acompanhando o olhar desses
primeiros estrangeiros, a obra divide-se em três partes: "O Imaginário do Novo Mundo", "Um Lugar do Universo", "A Construção
da Paisagem".
A primeira parte trata, principalmente, de representações do
imaginário europeu diante dos
desconhecidos nativos e da fauna
e flora tropicais.
Menos fantasiosa, a iconografia
coletada na segunda parte, produzida pelos cientistas e aventureiros que se esgueiraram pelas
matas e mares, registra em detalhes a topografia, a fauna e flora
particulares da nova terra. Além
do registro de detalhes sobre as
expedições marítimas ao Novo
Mundo, incluindo a cartografia
particular da época.
Por fim, o formato dos jardins
europeus serve de modelo para os
primeiros registros da paisagem
brasileira. A evolução desse olhar
sobre o cenário tropical vai ao século 19 e marca no tempo paisagens tão familiares aos brasileiros
de hoje.
Reunir mais de 500 pinturas,
gravuras e mapas de viajantes estrangeiros como Jean de Léry, frei
André Thevet, Theodore De Bry,
Albert Eckhout, Thomas Ender,
Jean Baptiste Debret, Alexander
von Humbolt, entre outros, é uma
forma de "levantar a questão da
multiculturalidade presente nas
representações sobre as quais se
fundam nossa consciência", diz
Belluzzo.
É uma maneira de registrar essa
rica iconografia fundadora de conhecimento e "descortinar o sentido do imaginário tão ficcional
que é o nosso", explica.
Segundo Belluzzo, não está se
falando de identidade nacional,
mas das mentalidades dos indivíduos, especificamente do imaginário formador dos brasileiros.
Ao mesmo tempo que mostra a
formação de nossa mentalidade,
o ponto de vista estrangeiro, a
partir do qual o Brasil e seus habitantes são mostrados, mantém a
contradição que está na base da
formação de nossas consciências,
em "colaboração internacional".
"O Brasil dos Viajantes" acaba
por se transformar em obra de referência, permitindo várias faixas
de leitura; tantas são as áreas de
interesses que o material iconográfico abrange."Qualquer leitor
se reconhece num pedaço do livro", afirma Belluzzo.
Reedição
Em 1994, o trabalho foi reunido
em três volumes, que foram distribuídos a alguns privilegiados
que faziam parte do "mailing list"
da construtora Odebrecht, empresa que patrocinou a pesquisa.
Por aquela época, o inventário
iconográfico resultou em uma exposição no Masp, chamadas breves no programa "Fantástico" da
Rede Globo e um simpósio internacional.
Segundo a professora, o sucesso
do trabalho deveu-se a uma necessidade dos brasileiros de enxergarem a si próprios.
Reeditada depois de cinco anos,
a obra é lançada comercialmente
em volume único.
Pesquisa
O trabalho é o resultado de uma
pesquisa acadêmica elaborada
por Belluzzo durante três anos.
O interesse interdisciplinar da
pesquisa rompe com a barreira da
departamentalização do conhecimento, própria da universidade.
Contando com um grupo de
pesquisadores ligados ao departamento de história da arte da FAU,
os estudos envolveram colaborações de especialistas em botânica
e zoologia, por exemplo.
Muitos trabalhos importantes
para o descortinar-se da cultura
nacional, como o de Belluzzo, são
elaborados em ambiente acadêmico, mas não possuem meios
para serem divulgados.
Livro: O Brasil dos Viajantes
Autora: Ana Maria de Moraes Belluzzo
Editora: Objetiva/Metalivros
Quanto: R$ 188 (516 págs.)
Texto Anterior: Clube: EUA combatem as "club drugs" Próximo Texto: Contardo Calligaris: O sumiço do erotismo de cada dia Índice
|