São Paulo, sábado, 16 de dezembro de 2006

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Artista criou suas próprias regras musicais

RONALDO EVANGELISTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Morreu Severino Dias de Oliveira, paraibano, 76 anos, albino e estrábico. Morreu Sivuca, gênio da música brasileira, maior que definições ou explicações. Sivuca sempre foi muitos, desde que, aos nove anos, embalava festas de casamento em sua Itabaiana natal. Fazia aulas sérias de música, mas fugia para cantar em serenatas. Sanfoneiro, era mestre do forró e animava qualquer baile. Acordeonista, era artista sofisticado que tocava com qualquer músico do mundo.
Sivuca fazia sua própria música, com suas próprias regras. Baião, bossa nova, jazz, samba, funk, choro, música africana, música européia. Com genialidade musical, carisma, senso de humor e simplicidade, conquistou o mundo: morou em Lisboa e Nova York, tocou com africanos, franceses, americanos e suecos. Nordestino, era cidadão do mundo.
Arranjador, orquestrador, compositor, pianista, violonista, guitarrista, aprendeu tudo de ouvido e de paixão pela música. Estudou para se aprimorar, sem perder o frescor da música da alma. Ultimamente, dedicava-se à música erudita, injetando o suingue da música das ruas nas câmaras de concerto.
Músico impressionante, pessoa discreta, Sivuca esteve por trás de músicas que fazem parte de nosso inconsciente, mesmo que não estivéssemos conscientes da figura dele. Além de suas próprias músicas e discos, foi o responsável por sucessos mundiais de Miriam Makeba, cantora de "Pata Pata". Sem ter ouvido direito o resultado, emprestou aos Mutantes música que eles retrabalharam, mantendo o lirismo: "Adeus, Maria Fulô".
Filho de sapateiros, músico que começou tocando nas rádios quando nem tinha rádio em casa, impressionava quem o ouvisse pela velocidade de seus dedos e de seu pensamento musical.
Adulto, virou músico de espetáculos americanos, acompanhante de cantores e instrumentistas. Nunca precisou se impor sobre quem acompanhava: sabia de suas qualidades e que podia mostrá-las assim, só com a música e o espaço que os colegas lhe concedessem.

Ser albino ajudou
Figura ímpar, simpática, cheia de senso de humor, certa feita disse, rindo, em entrevista ao site Gafieiras: "Duas coisas me ajudaram bastante. Uma: o nome. Outra: o fato de ser albino. Porque tem gente que toca muito bem, mas não é albina." Impossível de classificar e categorizar em algumas palavras, Sivuca fazia mais que música nordestina ou brasileira: fazia música sua, do mundo, para o mundo. Sempre foi muitos, sempre com a simplicidade.


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