|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MEMÓRIA
Screamin" Jay Hawkins morre em Paris
JON PARELES
do "The New York Times"
Screamin" Jay Hawkins, que
uivou, ganiu, gargarejou e berrou alguns dos mais desinibidos
desempenhos da história do
rock, morreu no sábado em
Neuilly-sur-Seine, subúrbio de
Paris. Ele tinha 70 anos.
A causa foi falha múltipla de
órgãos depois de uma cirurgia
de emergência para tratar um
aneurisma, segundo a agência
de notícias Associated Press.
"I Put a Spell on You", de 1956,
grande sucesso de Hawkins, definiu uma carreira baseada na
demência vocal, imagens tomadas de empréstimo ao vodu e
aos filmes B, um senso de humor anárquico e um show de
palco que levou a teatralidade
do rock'n'roll a um novo patamar. Ele tomou os estereótipos
da selvageria negra -canibais,
curandeiros- e zombou deles
com exagero aloprado.
Entrava no palco em um caixão em chamas, usando uma
capa de cetim negro, e, às vezes,
um osso no nariz, portando
uma bengala encimada por um
crânio flamejante, fumando um
cigarro, chamado Henry. Cobras, tarântulas, cabeças encolhidas e uma mão decepada se
arrastando pelo palco também
eram parte de seu arsenal.
Hawkins era parte da tradição
dos malucos do rhythm'n'blues,
que incluía também Little Richard, e foi o precursor dos exibicionistas do rock, como Jimi
Hendrix, Alice Cooper, Marilyn
Manson e White Zombie.
Jalacy J. Hawkins nasceu em
Cleveland, em 18 de julho de
1929. Sua mãe teve sete filhos,
cada um dos quais de um pai diferente. O grupo cresceu em lares adotivos.
Ele começou a tocar piano na
infância e estudou ópera no
Conservatório de Música do
Ohio. Foi também boxeador.
Quando voltou aos EUA, depois
de seu serviço militar, queria fazer carreira na ópera.
Mas, para ganhar a vida, ele
passou a trabalhar no circuito
de jazz e rhythm'n'blues, ampliando os limites de sua voz para imitar o som do sax tenor.
Começou a trabalhar com o
guitarrista de jazz Tiny Grimes
como camareiro e pianista, e,
em 1951, gravou o single, "Did
You Waste my Time", com Grimes e seus Rockin" Highlanders.
Os resultados desordenados e
inesquecíveis da sessão tornaram-se um sucesso, que muitas
rádios baniram de sua programação devido aos gemidos e
grunhidos. Aproveitando ao
máximo sua imagem selvagem,
Hawkins emendou uma lista de
sucessos a seguir, com canções
como "Feast of the Mau-Mau" e
"Alligator Wine".
O DJ e promotor Alan Freed
apareceu com a idéia de trazer
Screamin" Jay Hawkins ao palco
em um caixão em um show em
Cleveland. Hawkins contou um
dia que Freed lhe pagou US$ 5
mil para convencê-lo a aceitar a
proposta, ainda que outros relatos mencionem a gratificação
como US$ 300. O truque agradou o público, e o caixão se tornou parte regular do show.
Hawkins se cansou de ter de
adotar aquela "imagem estranha, escura, de vodu, de Vincent
Price" no palco, e, no começo
dos anos 60, se mudou para o
Havaí, onde comprou um bar e
tentou mudar de vida. Mas, no
final da década, ele tinha voltado aos shows, sempre com seu
personagem maligno, ainda que
continuasse protestando e com
esperanças de cantar ópera.
Hawkins fazia turnês regulares nos Estados Unidos e Europa. Abriu o show dos Rolling
Stones no Madison Square Garden em 1980, e Keith Richards
produziu a regravação de "I Put
a Spell on You". Papéis no cinema periodicamente serviram
para reanimar a carreira de
Hawkins. Ele fez pontas em
"American Hot Wax", de 1978,
"Mystery Train", de 1989, e "A
Rage in Harlem", em 1991. Em
1998, recebeu o Pioneer Award
da Rhythm'n'Blues Foundation.
Diferentemente da maioria
dos primeiros artistas do rock,
Hawkins continuou dono dos
direitos autorais sobre suas canções, incluindo "I Put a Spell on
You", que lhe trouxe muitos royalties ao ser gravada por artistas como Nina Simone e o Creedence Clearwater Revival. Em
1997, a canção foi sampleada
por Notorious B.I.G. para "Kick
in the Door", do álbum "Life After Death".
Tradução Paulo Migliacci
Texto Anterior: Cinema - Berlim: Yimou sentimental esvazia festival Próximo Texto: Joaquim Pedro tem ciclo de primeira no MIS Índice
|