São Paulo, quinta-feira, 17 de fevereiro de 2000


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MEMÓRIA
Screamin" Jay Hawkins morre em Paris

JON PARELES
do "The New York Times"

Screamin" Jay Hawkins, que uivou, ganiu, gargarejou e berrou alguns dos mais desinibidos desempenhos da história do rock, morreu no sábado em Neuilly-sur-Seine, subúrbio de Paris. Ele tinha 70 anos.
A causa foi falha múltipla de órgãos depois de uma cirurgia de emergência para tratar um aneurisma, segundo a agência de notícias Associated Press.
"I Put a Spell on You", de 1956, grande sucesso de Hawkins, definiu uma carreira baseada na demência vocal, imagens tomadas de empréstimo ao vodu e aos filmes B, um senso de humor anárquico e um show de palco que levou a teatralidade do rock'n'roll a um novo patamar. Ele tomou os estereótipos da selvageria negra -canibais, curandeiros- e zombou deles com exagero aloprado.
Entrava no palco em um caixão em chamas, usando uma capa de cetim negro, e, às vezes, um osso no nariz, portando uma bengala encimada por um crânio flamejante, fumando um cigarro, chamado Henry. Cobras, tarântulas, cabeças encolhidas e uma mão decepada se arrastando pelo palco também eram parte de seu arsenal.
Hawkins era parte da tradição dos malucos do rhythm'n'blues, que incluía também Little Richard, e foi o precursor dos exibicionistas do rock, como Jimi Hendrix, Alice Cooper, Marilyn Manson e White Zombie.
Jalacy J. Hawkins nasceu em Cleveland, em 18 de julho de 1929. Sua mãe teve sete filhos, cada um dos quais de um pai diferente. O grupo cresceu em lares adotivos.
Ele começou a tocar piano na infância e estudou ópera no Conservatório de Música do Ohio. Foi também boxeador. Quando voltou aos EUA, depois de seu serviço militar, queria fazer carreira na ópera.
Mas, para ganhar a vida, ele passou a trabalhar no circuito de jazz e rhythm'n'blues, ampliando os limites de sua voz para imitar o som do sax tenor.
Começou a trabalhar com o guitarrista de jazz Tiny Grimes como camareiro e pianista, e, em 1951, gravou o single, "Did You Waste my Time", com Grimes e seus Rockin" Highlanders.
Os resultados desordenados e inesquecíveis da sessão tornaram-se um sucesso, que muitas rádios baniram de sua programação devido aos gemidos e grunhidos. Aproveitando ao máximo sua imagem selvagem, Hawkins emendou uma lista de sucessos a seguir, com canções como "Feast of the Mau-Mau" e "Alligator Wine".
O DJ e promotor Alan Freed apareceu com a idéia de trazer Screamin" Jay Hawkins ao palco em um caixão em um show em Cleveland. Hawkins contou um dia que Freed lhe pagou US$ 5 mil para convencê-lo a aceitar a proposta, ainda que outros relatos mencionem a gratificação como US$ 300. O truque agradou o público, e o caixão se tornou parte regular do show.
Hawkins se cansou de ter de adotar aquela "imagem estranha, escura, de vodu, de Vincent Price" no palco, e, no começo dos anos 60, se mudou para o Havaí, onde comprou um bar e tentou mudar de vida. Mas, no final da década, ele tinha voltado aos shows, sempre com seu personagem maligno, ainda que continuasse protestando e com esperanças de cantar ópera.
Hawkins fazia turnês regulares nos Estados Unidos e Europa. Abriu o show dos Rolling Stones no Madison Square Garden em 1980, e Keith Richards produziu a regravação de "I Put a Spell on You". Papéis no cinema periodicamente serviram para reanimar a carreira de Hawkins. Ele fez pontas em "American Hot Wax", de 1978, "Mystery Train", de 1989, e "A Rage in Harlem", em 1991. Em 1998, recebeu o Pioneer Award da Rhythm'n'Blues Foundation.
Diferentemente da maioria dos primeiros artistas do rock, Hawkins continuou dono dos direitos autorais sobre suas canções, incluindo "I Put a Spell on You", que lhe trouxe muitos royalties ao ser gravada por artistas como Nina Simone e o Creedence Clearwater Revival. Em 1997, a canção foi sampleada por Notorious B.I.G. para "Kick in the Door", do álbum "Life After Death".


Tradução Paulo Migliacci


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