São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 2000


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CINEMA - ESTRÉIA
"Neve sobre os Cedros" confronta EUA e Japão

FÁTIMA GIGLIOTTI
de Paris

O ugandense Scott Hicks conseguiu a proeza de ser indicado ao Oscar de filme e direção com sua segunda produção, "Shine - Brilhante". Volta à direção com "Neve sobre os Cedros" -mas, desta vez, o resultado atraiu só a indicação pela fotografia.
Baseado no romance de David Guterson, "que me seduziu pela beleza da história e pela intensidade visual da narrativa", "Neve sobre os Cedros" é ambientado na ilha de São Pedro, situada no Pacífico Norte. O julgamento de um oriental, acusado do assassinato de um americano, seu melhor amigo, acorda o ressentimento e o preconceito entre as comunidades americana e japonesa.
O ano é 1950. Mas a verdadeira história do filme, o primeiro amor entre um ocidental (Ethan Hawke) e uma japonesa (Yuki Kudoh), brutalmente separados pela guerra, acontece no passado. Para Hicks, o livro e o filme são um grande ensaio sobre a memória.
"O tribunal é o lugar no qual os personagens são forçados a acertar contas com o passado, o ponto de partida. Por isso eu uso muitos "flashbacks" e preto-e-branco."
O diretor confessa ser obsessivo. "Eu reconheço esse sentimento, por isso gosto de histórias de obsessões, como a do Ishmael (Hawke), um homem obcecado pelo seu primeiro amor", diz.

Max von Sydow
Hicks garante que dirigir Max von Sydow, "um dos atores da minha formação", não o intimidou. Sydow, por outro lado, diz que, chegando aos 71 anos e ao 120º filme de uma carreira impecável, o primeiro papel de advogado é um acontecimento.
"Não estou certo, mas acho que é a primeira vez. Se eu precisasse de inspiração, iria aos grandes clássicos de tribunal, mas sempre relia algumas páginas do livro (de David Guterson) e encontrava novos elementos para a interpretação."
Irônico, Sydow disse que recebe tantos roteiros ruins para ler "que chega a ser constrangedor". Por isso, quando encontra um bom roteiro, "um milagre", logo engaja-se no projeto. Neste, o que atraiu Sydow foi "não apenas a boa história, na qual as pessoas, no final, fazem as escolhas certas, mas o caráter sensato do seu personagem". "Pelo menos, ele tenta agir com bom senso."
O que o ator não diz é que essa sensatez é um atributo da maturidade, como fica explícito em vários diálogos, nos quais o personagem usa o fato de estar à beira da morte para dar credibilidade à sua defesa do acusado.
"Eu gostaria de ser mais otimista em relação ao preconceito e ao racismo, mas acho que a humanidade sempre repete os mesmos erros", diz o ator. A referência constante à morte nos diálogos de seu personagem invoca, inevitável, o clássico "O Sétimo Selo" (1957), de Ingmar Bergman, no qual Sydow interpreta a Morte.
"Nós partilhamos um extraordinário amor pelo teatro e pelo cinema por muitos anos, mas Bergman não é meu único pai, e eu não me senti órfão nem "marcado" quando acabou a nossa parceria", conclui Sydow.


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