São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 2006

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MÚSICA/CRÍTICA

Banda mostra ter superado má fase, entretanto precisa parar de cultuar o passado e experimentar mais

Oasis está maduro, mas ainda não está pronto

SYLVIA COLOMBO
EDITORA DO FOLHATEEN

De tanto alardearem por aí que são a melhor banda do planeta, daqui a pouco os caras vão acabar nos convencendo. Mas... só daqui a pouco.
Anteontem, às margens do rio Pinheiros e diante de um público ensopado, o Oasis mostrou que tem bala para continuar na luta por um lugar nobre na história do rock. Que o limbo no qual se perdeu entre o fraquinho "Be Here Now" (1997) e o contundente "Don't Believe the Truth" (2005), no futuro, pode não passar de um lapso passageiro. Que, enfim, os vetustos (ou finados) Beatles poderão olhar (de onde estiverem) para os irmãos Gallagher e sua turma com uma lágrima furtiva nos olhos e dizer: "Meus filhos".
Mas, até lá, como diriam nossos pais, o Oasis ainda tem que comer muito feijão. Um pouco mais de bom humor também não seria de todo ruim. Sem, é claro, perder a saudável empáfia pela qual são conhecidos (e que anda fazendo tanta falta no politicamente correto showbiz de hoje). Por fim, deveriam parar de cultuar tanto o passado e experimentar mais. Conscientes das mancadas recentes, a banda fez um show calcado nos exitosos dois discos que abriram sua carreira, "Definitely Maybe" (1994) e "(Whats the Story) Morning Glory" (1995), e nas canções adultas da atual fase.
Liam, na sua tradicional postura "torre de Pisa" (inclinado) e com as mãos para trás como quem foi algemado, está poderoso nos vocais. Às vezes, pára na vertical e olha o público, sério. Lembra Bowie. Noutras, arrasta mais as vogais, parece um Mick Jagger menos sexy, mais zombeteiro.
Noel, por sua vez, demora para ser descoberto pelo câmera que pilota o telão, que parece tê-lo confundido com o guitarrista Gem Archer. Até que o verdadeiro líder da banda assume o microfone e canta "The Importance of Being Idle", embalado por um estilo The Kinks. Noel mantém-se discreto, mas se solta quando percebe que o público quer cantar junto. Em "Don't Look Back in Anger", parece orgulhoso ao ver a multidão entoando versos inteiros da canção. Seu grande momento, entretanto, é na agressiva "Mucky Fingers", claramente inspirada por "I'm Waiting For the Man", do Velvet Underground.
Futebolistas fanáticos, dedicam a melhor música da banda, "Live Forever", à seleção brasileira. Se parecem saber sobre o nosso fanatismo, quem mostrou não conhecer bem as preferências dos roqueiros foi parte do público de São Paulo. Um monte de gente usava camisetas do Manchester United, quando o time de coração dos Gallagher é, na verdade, o Manchester City.
Bacana foi perceber que o Oasis é, enfim, uma banda. Depois de tantas mudanças na formação, o que antes podia ser comparado com um país submetido a uma ditadura sob o comando dos irmãos, hoje é uma república democrática. Agora, "os outros", Gem Archer e o baixista Andy Bell, dão declarações livres, são articulados e, nitidamente, ajudaram a melhorar o som da banda. Zak Starkey, filho de Ringo Starr, é mais agressivo que o pai e confere energia às canções. Um bom sinal desses tempos de "abertura política" é que a canção que abre os shows da atual turnê é de Bell, a alegre "Turn Up the Sun".
Apesar de evocarem o astro-rei, ironicamente, quem co-protagonizou o espetáculo no estacionamento do Credicard Hall foi a chuva. Começou tímida na segunda música, "Lyla", faixa de trabalho do álbum atual. Apertou na épica "The Masterplan" e só acabou, ironicamente, quando Liam finalizou a última canção antes do bis, "Rock n" Roll Star".
A banda encerrou a noite homenageando o The Who, numa versão furiosa de "My Generation". Bela síntese do espetáculo. Saímos contentes e esperançosos com o rock, mas com uma sensação de que só o culto ao passado não basta para mantê-lo vivo.
É claro que é bom para uma banda ser tão comparada aos Beatles, ao Velvet, a Dylan e Bowie. Mas já estamos noutro século. E quem, como o Oasis, andou bebendo tanto dessas fontes, deve parar de temperar tanto sua música com referências a esses ícones e colocar na mesa novas cartas.
Fica como lição de casa para a próxima visita. OK, Noel?


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