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RELÂMPAGOS
Relento
JOÃO GILBERTO NOLL
"Esse atraso corta o raciocínio", dizia um homem de jaleco a me olhar. Eu estava entrando à toa na sala. Por que
logo ali, merecendo aqueles
olhares de desaprovação? Poderia ter entrado em outros
compartimentos -o prédio
era enorme, tantos corredores... Mas abri aquela porta. E
não devia recuar. Três passos
até a cadeira onde sentei. Todos saíam. Restando tão-só
um cadáver ali na mesa de
aço, com certeza fria... "De
folga, anatomia?" Fui ver...
Levantei o pano que cobria o
defunto. Vi sem surpresa: era
um colega meu morador de
rua. Andava mesmo se queixando de dores. Curvei-me,
como costumava fazer toda a
manhã para ouvi-lo pedir a
hora. A hora na torre do cartão-postal. Tirava-a do bolso
como um truque. A minha locução inaugurava o dia.
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