São Paulo, sexta-feira, 17 de maio de 2002

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MÚSICA/LANÇAMENTOS

"MTV UNPLUGGED Nš 2.0"

CD mostra a cantora repelindo os flashes da fama

Lauryn Hill lança disco ao vivo de (auto) protesto

CLAUDIA ASSEF
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois do multipremiado disco de estréia "The Miseducation of Lauryn Hill", de 98, a ex-vocalista dos Fugees volta com material inédito, gravado ao vivo no esquema banquinho e violão para a MTV americana. O disco chega às lojas do Brasil em duas semanas.
O mote do novo álbum -duplo- é tão somente o velho dilema do "Oh, Deus, como eu pude fazer tanto sucesso".
Que você já viu esse filme não há dúvida. A asfixia causada pelos flashes da fama atormentou e em muitos casos levou artistas desta para melhor. A diferença é que talvez pela primeira vez alguém tenha feito um disco temático, totalmente voltado ao discurso "anti-sucesso".
Num dos muitos minutos que "Lauryn Hill MTV Unplugged 2.0" dedica à falação há frases como: "Vocês vieram ver Lauryn Hill. Mas vocês não me conhecem. Nunca me conheceram. Vou apresentá-los a mim mesma. Enquanto eu cresço, vocês vão me conhecendo um pouco melhor". Há culpa, muita culpa espalhada pelos 26 aninhos da cantora.
Mais adiante ela relativiza: "Sei que o conteúdo de muitas dessas músicas é pesado. As pessoas querem fantasia. Mas precisam é encarar a realidade".
Para emoldurar o discurso de (auto)protesto, Hill se inspirou no formato violão/voz rouca/letras potentes que Bob Marley tanto usou no passado. Aliás, se estivesse vivo, Marley não seria apenas seu "muso" inspirador, mas o avô dos dois filhos de Hill -a cantora vive com Rohan, um dos zilhões de filhos do rei do reggae.
Em alguns momentos, a moça chega a plagiar (ou homenagear) Marley. Em "I Find It Hard to Say (Rebel)", ela diz: "O que eu tenho a dizer é rebelem-se", frase que Marley incluía, muitas vezes como improviso, em suas letras.
A voz de Hill, que ficou famosa com a cover de Roberta Flack, "Killing Me Softly", ainda nos Fugees, também parece embebida em culpa. No disco, trocou o tom cristalino pela rouquidão. Outra referência a Marley?
Se musicalmente o disco mostra que Hill sabe compor boas músicas -a ponto de dispensar banda de acompanhamento- as letras, até pela temática cansativa, pecam um pouco pelos clichês. Em "I Just Want You Around" ela ataca: "Essa é a minha cruz/ Deixe-me carregá-la/ Eu estava perdida/ E agora me encontrei".
"I Gotta Find Peace of Mind" é outra que exibe a culpinha de estimação de Hill. "Tenho que contar a vocês/ O quanto de dor isso tem me causado/ Às vezes eu brigo comigo mesma/ Não sei como você aguenta alguém tão inseguro e imaturo/ Por favor, não brigue comigo/ Não tenho identidade". A essa altura, se você fala inglês, já está a ponto de mandar um e-mail de apoio à auto-estima da moça. Mas tem mais: ela termina a música se debulhando em lágrimas.
Em "Mystery of Iniquity" ela põe no mesmo saco maus sentimentos: hipocrisia, orgulho, cobiça, vingança, promiscuidade, extorsão, ambição...
Em "I Get Out", ataca de frente a indústria do disco. "Agora entendi que você quer me usar/ Mas resolvi optar pela vida/ Chega de comprometimentos/ Eu saio de todas as suas caixas/ Não respeito o seu sistema/ Você não pode me prender nessas correntes/ O sistema é uma piada/ Condicionamento animal, só para nos manter como escravos".
A moça, que já foi atriz -estrelou seriados de TV e filmes comerciais-, ganhou cinco prêmios Grammy de uma só vez e frequentou uma das melhores universidades dos EUA (a Columbia), não segurou a onda de fazer sucesso, está claro.
Resta saber como ela vai encarar o dualismo de vender bem um disco como este.


MTV Unplugged Nš 2.0     
Artista: Lauryn Hill
Lançamento: Sony
Quanto: R$ 50, em média



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