São Paulo, quarta-feira, 17 de maio de 2006

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Cannes para iniciantes

Novos diretores latinos competem pela Palma de Ouro ao lado de nomes consagrados no festival que começa hoje

Divulgação
Cena de "Buy it Now", curta do brasileiro Antonio Campos


SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A CANNES

O 59º Festival de Cannes, que começa hoje com a pré-estréia hors-concours de "O Código Da Vinci", escala sangue novo e latino para temperar a disputa deste ano pela Palma de Ouro, o mais prestigioso prêmio entre os festivais internacionais de filmes.
Ao lado de habitués de importante calibre, como o italiano Nanni Moretti, o espanhol Pedro Almodóvar, o inglês Ken Loach e o finlandês Aki Kaurismäki, estão no páreo dois diretores mexicanos, Alejandro González Iñárritu e Guillermo del Toro, e o argentino de origem uruguaia Adrián Caetano.
Os três são recém-chegados à competição principal, mas não ao Festival de Cannes, que projetou a todos quando os escalou para a seção paralela Semana da Crítica.
Del Toro, 41, que é também maquiador e produtor, esteve na mostra com seu primeiro longa-metragem como diretor, "Cronos" (1993). Iñárritu, 42, também levou para a Semana seu filme de estréia, "Amores Brutos" (2000), enquanto Caetano, 36, participou com seu segundo título para cinema, "Bolivia" (2001).
O filme de Caetano -"Crónica de una Fuga", agora rebatizado "Buenos Aires, 1977"- não constava na primeira lista da competição oficial de Cannes, divulgada em 20 de abril. Nessa data, o título estava escalado na seção paralela Um Certo Olhar. Uma semana depois, o festival anunciou sua inclusão na disputa pela Palma de Ouro, sem explicações adicionais.

"Grato mistério"
O diretor diz que ele tampouco sabe as razões que levaram à mudança e afirma que não tentou esclarecer o "grato mistério". "Não perguntei o porquê, com medo de eles se darem conta de que haviam cometido um erro", afirma, em entrevista à Folha.
Esse quarto longa do cineasta é baseado na história real de um goleiro preso pela repressão, na ditadura militar argentina (1976-83), em que estimados 30 mil detidos desapareceram.
Caetano diz que o fato de a história ter um final "se não feliz, ao menos diferente do que se costuma ver nos filmes sobre esse marco sociopolítico" foi o que o motivou a contá-la.
Outro aspecto inusual do thriller argentino é a abordagem da prática da delação de inocentes pelo grupo guerrilheiro Montoneros. A acusação a quem não pertencia ao movimento tinha o objetivo de proteger seus verdadeiros ativistas (leia texto sobre o filme à direita).
É no aspecto da delação que o diretor enxerga o contato da narrativa histórica com a realidade atual. "Vejo isso como uma metáfora concreta das sociedade latino-americanas de hoje, onde parece que a única forma de se salvar é delatando o próximo."
Para o diretor, essa seria "uma herança das ditaduras sul-americanas", aliada a "certa imposição no plano econômico e na formação sociopolítica destas nações, que se baseia na idéia da salvação individual".
"Crónica de una Fuga" e o filme de Del Toro ("El Laberinto del Fauno") estão escalados para o último dia da competição, 27/5.

Outros favoritos
Iñárritu ocupa o meio da agenda, embolado com os potencialmente favoritos "Il Caimano" (Moretti) e "Marie-Antoinette" (Sofia Coppola).
Em geral, organizadores de festivais reservam para a data de encerramento ou os filmes que não têm nenhuma chance de vencer, ou aqueles que desbancam os favoritos na reta final, provocando o efeito "inversão de expectativa", o que eleva o impacto do resultado -sobre a mídia, inclusive.
O júri de Cannes, presidido pelo chinês Wong Kar-wai ("2046", "Amor à Flor da Pele"), tem entre seus membros a diretora argentina Lucrecia Martel ("A Menina Santa"). Kar-wai também tem sua relação com o país vizinho. Filmou lá "Felizes Juntos" (1997). Indicativo de chances de premiação para Caetano? Difícil prever.


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