São Paulo, sexta-feira, 17 de junho de 2005

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CINEMA/"BATMAN BEGINS"

David S. Goyer, roteirista do quinto filme da série, fala sobre a adaptação que chega às telas hoje

"O nosso é o melhor", diz escritor de "Batman"

DIEGO ASSIS
ENVIADO ESPECIAL A LOS ANGELES

Em toda a história dos quadrinhos, sempre houve espaço para o duplo, seja ele o alter ego do próprio herói, sejam os personagens coadjuvantes que funcionam como uma espécie de contraponto moral aos mascarados.
Em "Batman Begins", quinto filme da franquia, que estréia hoje no país, o diretor Christopher Nolan teve também o seu "duplo". É o roteirista David S. Goyer, nerd de carteirinha e veterano em transformar páginas de HQs em fotogramas de cinema.
Em seu currículo, o escritor norte-americano tem a trilogia "Blade", a continuação de "O Corvo", um novo roteiro para "The Flash" -que começa a ser escrito em 2006- e também assina um dos primeiros scripts de "Motoqueiro Fantasma", previsto para o ano que vem.
Parte da relação de Goyer com as HQs vem de sua experiência de quase quatro anos como escritor da série "Sociedade da Justiça", da DC Comics. A outra parte deve-se ao fato de ter sido ele próprio devorador de gibis de super-heróis desde a adolescência.
Integrante da comitiva que, no início do mês, recebeu jornalistas internacionais para conversar sobre "Batman Begins", em Los Angeles, Goyer falou à Folha, em entrevista exclusiva para a América Latina. Falou, não. Sussurrou.
Acometido por uma laringite severa, sua voz soava como a de Harvey Pekar, roteirista underground americano que teve suas HQs levadas ao cinema em "O Anti-Herói Americano", vivido por Paul Giamatti. Idiossincrasias do mundo dos quadrinhos...

 

Folha - Muitos de seus filmes envolvem personagens de quadrinhos. Na sua opinião, que elementos fazem uma boa adaptação?
David S. Goyer -
Creio que uma boa adaptação de quadrinhos tenha de ter apreço pelo material-fonte. É necessário paixão por quadrinhos mas também saber quais elementos precisam ser mudados. Houve algumas grandes adaptações de quadrinhos, como "Homem-Aranha" e "X-Men", e houve algumas nem tão boas. As menos bem-sucedidas foram as que mudaram muito em relação aos quadrinhos originais. Pois existe um motivo por que esses personagens vêm tendo sucesso por 40, 50 ou 66 anos, no caso do Batman. Há algo importante a se aprender ali [nas revistas].

Folha - Como compara o seu filme com os outros "Batman"?
Goyer -
O nosso é o melhor. Gosto de que não seja cartunesco, mas realista, como se aquilo pudesse ter acontecido. Os outros filmes se distanciaram muito de como Batman é retratado nos quadrinhos. Adoro os primeiros, de Tim Burton, mas depois foi ficando como um programa de TV, em direção à concepção popular dele. Enquanto o nosso filme tem mais o estilo [das "graphic novels"] de Frank Miller, Alan Moore, Dennis O'Neill, Neil Adams... uma abordagem mais clássica, dark e sóbria de Batman.

Folha - Ao mesmo tempo, o roteiro tenta preencher lacunas até então inexplicadas nas HQs...
Goyer -
Somente queríamos um "Batman" sério, que as pessoas chorassem e que fosse um dos grandes filmes de aventura de todos os tempos, não apenas um "filme de quadrinhos". Queríamos sair de Gotham City e que o batmóvel, o uniforme, as armas, tudo fosse baseado na realidade.

Folha - Ao longo do filme, a palavra "medo" é usada com recorrência. Qual a importância desse elemento na história de Batman?
Goyer -
O medo é a força-guia na vida de Bruce Wayne. Foi para superá-lo que criou o Batman. É também o medo que guia [os vilões] Ra's Al Ghul e Espantalho. O medo é o grande tema do filme.

Folha - E dos EUA também?
Goyer -
Certamente. Há muita apreensão dos americanos em relação ao mundo, ao terrorismo, ao que acontece no Iraque e ao que nosso governo está fazendo. As pessoas estão assustadas. É por isso que filmes escapistas estão conquistando tanto terreno agora. Eles sempre conquistam quando as pessoas estão com medo.

Folha - Sabe-se que, em Hollywood, muitos roteiros são alterados pelos executivos dos estúdios. Isso aconteceu em "Begins"?
Goyer -
Isso acontece muito, mas tenho sorte que meus filmes não tenham sido reescritos tantas vezes. Além do mais, eu e Chris [Nolan] tínhamos um ótimo relacionamento, e o filme é mais ou menos o que eu queria desde o início.

Folha - Nolan não sugeriu que se tirassem as máscaras para aumentar o grau de realismo do filme?
Goyer -
Sim, mas eu queria uma abordagem realista também. Chris era o cão de guarda, que dizia: "OK, sei que temos de ter a máscara, o cinto de utilidades, mas precisamos explicar por que Bruce precisa usar isso. Por que isso aconteceria na vida real?".

Folha - É verdade que você teve de vender sua coleção de gibis?
Goyer -
Sim. Eles estavam tomando muito espaço.

Folha - Mesmo os "Batman"?
Goyer -
Mesmo os "Batman". Mas a [editora ] DC Comics me deu tudo o que eu precisava. Eles estavam tão felizes comigo que me dariam tudo que quisesse!


O jornalista Diego Assis viajou a convite da Warner Bros.

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