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CRÍTICA
Homem-morcego se torna um herói da iniciativa privada
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Existe , primeiro, a infância
de Bruce Wayne, o futuro
Batman: o dia em que caiu num
poço cheio de morcegos, a fatídica
noite em que os pais foram assassinados em uma Gotham City
cheia de problemas sociais.
Depois vem o encontro com
Henri Ducard (Liam Neeson), o
homem da Liga das Sombras. Ele
será seu mestre, ensinando-lhe os
princípios filosóficos que, sabemos, são a base das lutas marciais
em que Wayne se torna mestre,
enrijecendo corpo e espírito.
Em poucas palavras, "Batman
Begins" começa com um bocado
de psicologia barata e filosofia
oriental de almanaque. Podemos
desde então esperar pelo pior. Logo a liga bota as manguinhas de
fora: sua missão é destruir Gotham City. E por quê? Segundo
Ducard, um lugar tão corrompido tem de ser destruído.
Nesse momento, Bruce Wayne
percebe que está lidando com um
grupo de malucos. Volta a Gotham disposto a usar sua herança
para o bem. Mas sua empresa foi
usurpada. Tudo está de fato muito corrompido. A única maneira
que encontra de lutar para resolver os problemas da cidade é tornando-se Batman -para o que
conta com a ajuda de seu fiel mordomo (Michael Caine) e de um
cientista (Morgan Freeman).
A partir daí, Batman começa a
combater por conta própria o poder da corrupção. O poder público, representado pela promotora
Rachel Dawies (Katie Holmes),
por sinal namorada de infância de
Bruce Wayne, não emplaca uma
numa cidade de juízes, policiais e
tudo o mais corruptos.
Em síntese, o Batman que nos
sugere o diretor e roteirista Christopher Nolan é uma ONG de um
homem só, tomando o lugar de
um Estado falido. Nolan, um britânico nascido em 1970, parece ter
crescido sob a saudável influência
de Margaret Thatcher, de maneira que não lhe custa muito entregar a responsabilidade pela cidade para Batman, homem-ONG,
que afinal já era dono de mais ou
menos tudo mesmo.
É verdade que outros personagens não receberão a idéia com o
mesmo entusiasmo, não por serem partidários de um aparelho
estatal inchado ou algo assim,
mas por pretenderem se aproveitar pessoalmente do mar de lama
que cobre Gotham City.
Se considerarmos "Batman" como uma série fechada -à maneira de "Guerra nas Estrelas", este é
de agora em diante o exemplar
inaugural, em que todas as bases
são lançadas. Aquele que, malgrado sua insignificância, poderá,
quando sair em DVD com outros,
dar ao conjunto um sentido capaz
de desvirtuar as molecagens inconformistas de Tim Burton em
"Batman" e "Batman, o Retorno"
(os seguintes eram apenas empreitadas comerciais).
"Batman Begins" é, no fim das
contas, um título a propósito, menos por contar o que seria o início
da saga de Batman e mais por estabelecer o privatismo neoliberal
como princípio orientador de toda a saga. A outra questão é: ao
menos ganha-se algo em termos
de aventura? A resposta é: nada.
Tirando as piadas britânicas de
Michael Caine, sobra muito pouco neste filme.
Batman Begins
Batman Begins
Direção: Christopher Nolan
Produção: EUA, 2005
Com: Christian Bale, Michael Caine
Quando: a partir de hoje nos cines
Anália Franco, Butantã, Eldorado, Shopping D e circuito
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