DA REPORTAGEM LOCAL

Se há uma área nos EUA cujo modo de vida é sempre relacionado à música produzida ali, esse lugar é Los Angeles. Cidade sempre ensolarada, da gigantesca Sunset Boulevard, do clube Whiskey a Go Go, dos surfistas que passeiam por Santa Monica e dos hippies de Venice Beach, foi encapsulada por artistas e bandas como Beach Boys, The Mamas & The Papas, The Doors, Guns n'Roses... Nas últimas duas décadas, poucos representaram tão literalmente esse espírito californiano como os Red Hot Chili Peppers, grupo liderado pelo vocalista Anthony Kiedis e pelo baixista Flea.
Também ensolarada, mas com um lado dark, é "Scar Tissue", autobiografia de Kiedis escrita com a ajuda de Larry Sloman, lançada em 2004 nos EUA e que ganha edição brasileira (Ediouro).
O livro, que, claro, não tem a importância histórica de "Crônicas", de Bob Dylan, recém-lançada no país, é mais revelador do que grande parte das memórias de artistas pop que chegam às livrarias; principalmente porque Kiedis não desvela sem eufemismos a dependência de drogas pesadas que o acompanha desde que era adolescente.
"Durante anos e anos enchi seringas e injetei-me com cocaína, anfetamina, heroína preta, heroína persa e uma vez até LSD", escreve o cantor -que está abstêmio nos últimos quatro anos- logo no começo do livro.
A história de Kiedis é a história de um garoto nascido numa cidadezinha de Michigan que se mudou para Los Angeles com o pai, um ator B, e conheceu estrelas do showbiz ainda quando criança.
"Scar Tissue" traz passagens tensas, como a morte do primeiro guitarrista dos Chili Peppers, Hillel Slovak, por overdose, e o relacionamento do cantor com a estilista junkie Jennifer Bruce, ao lado de lembranças nonsense de Kiedis: "Enquanto Jennifer era uma superestrela punk moderna e autofabricada, Ione parecia uma ninfa da floresta, natural e suave. Tinha cabelos castanhos longos e cacheados, um lindo jeito de andar e era um pouco dentuça. Sempre adorei dentuças". A Califórnia de Kiedis não é a Califórnia glamourosa de "O.C."... (THIAGO NEY)