São Paulo, sexta, 17 de julho de 1998

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Tecno projeta sua imagem nos Flyers


Criados para divulgar a música, panfletos se tornaram expressão visual da cultura eletrônica


PATRICIA DECIA
da Reportagem Local

Se, nos anos 60, cartazes criados para anunciar shows se transformaram num dos melhores registros visuais da psicodelia, três décadas depois a estética da música eletrônica encontrou no flyer o seu veículo de expressão.
Substitutos dos convites, esses panfletos, em geral muito coloridos, foram batizados a partir do verbo to fly (voar, em inglês), numa alusão a seu modo de distribuição ao público, "voando" de mão em mão.
Como os cartazes, foram criados não para ser arte, mas por razões comerciais, já que seu objetivo primordial é informar, a baixo custo, clubbers e ravers, divulgando festas e casas noturnas.
Mas, com a disseminação da cultura e o crescimento do investimento na área, a produção de flyers (pronuncia-se "fláiers") passou a seguir uma única regra: quanto mais diferente, melhor.
O resultado é que, principalmente na Europa, eles são objeto de livros e até exposições (leia texto abaixo).
Trabalho de artistas gráficos com o uso do computador, somado a ilustrações ou fotos, os flyers estão incontestavelmente ligados à música eletrônica. Até na maneira de fazer.
"É complementar. O DJ faz seu disco sozinho, no quarto, na frente do computador. Nós também trabalhamos assim", diz o designer gráfico brasileiro Marcelo Garrafa, criador dos flyers do Hell's Club, em São Paulo.
Outra consequência disso, segundo ele, é que ser músico ou artista deixa de ser uma "dádiva". "É uma nova maneira de comunicação jovem. Está acessível. E, como na música, o trabalho acaba ganhando um caráter anônimo", afirma.

Expansão brasileira
Em São Paulo, o mercado de flyers está vivendo uma expansão. Certamente, um dos motivos é o sucesso de duas casas noturnas (B.A.S.E e Florestta) e das grandes festas de sítio, as raves. Atraindo milhares de pessoas, esses locais estão ganhando patrocinadores como as marcas de cigarro Camel e Marlboro, e, consequentemente, mais dinheiro.
Assim, dos folhetos em xerox, papel e impressão menos nobre -que ainda continuam em alguns lugares, como clubes da zona leste da cidade e bares-, passou-se para trabalhos mais bem elaborados, impressos em quatro cores.
A produção geralmente começa com o dono, promoter ou organizador da noite dando uma idéia geral do quer para o designer. A partir daí, o trabalho é livre.
Atualmente, um pequeno número de designers é responsável pela maioria dos flyers. Entre eles, já há quem consiga viver exclusivamente desse trabalho. É o caso de Paulinho, da Hypno Design (sua marca), que faz flyers para o B.A.S.E e para raves como a XXX-Perience.
Segundo ele, a "cara" do flyer é definida, em boa parte, a partir do tipo de música -entre as divisões na música eletrônica- que vai tocar naquela noite.
Os flyers de raves, festas ao ar livre que chegam a reunir cerca de 5.000 pessoas, tendem sempre a contar com elementos psicodélicos, muitas cores e símbolos indianos, elementos associados à música trance. Já nos clubes, outros códigos são empregados, sempre tendendo para o hi-tech.
Dependendo desses elementos, o público também identifica -e se identifica com- a festa.
No caso do Hell's, que continua ainda hoje como um núcleo dentro da cena em São Paulo, os flyers adquirem até uma função exclusiva. "Tento usar sempre elementos de lá de dentro, fotos das pessoas. Acho que quem vê tem uma idéia do que é. E, se não gostar, não vai", diz Garrafa.
Andrea Gram, DJ do clube Alien, é entusiasta do flyer. Tanto que já organizou uma exposição com trabalhos brasileiros e estrangeiros e pensa em fazer outra em breve. "Há trabalhos muito legais, que realmente fazem você prestar atenção, olhar horas e horas, descobrir coisas", disse.
Gram também coleciona flyers. Se der sorte, pode até estar de posse de pequenas obras de arte valiosas, como são considerados hoje os cartazes de 30 anos atrás.



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