São Paulo, sexta-feira, 17 de agosto de 2001

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"HARRY CHEGOU PARA AJUDAR"

Thriller faz exploração imatura e incapaz do universo hitchcockiano

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

A perfeita banalidade das primeiras cenas de "Harry Chegou para Ajudar" está longe de justificar o suspense da trilha sonora que o diretor Dominik Moll encomendou a David Whitaker, um velho compositor de filmes de horror: em férias com as três filhas, um jovem casal contorna os problemas da viagem.
Trata-se de um suspense quase involuntário, esse expresso pelo descompasso entre a tensão da música e a banalidade da situação. É a única vez em que a inabilidade de Moll conta a seu favor: o diretor cria, a partir desse hiato, um presságio de morte. De resto, quando tenta deter-se nos mecanismos do suspense, Moll se revela sempre incapaz de dominá-los.
"Harry Chegou para Ajudar" pertence à extensa e malfadada tradição da cinematografia francesa dos filmes sub-hitchcockianos. Nos anos 50, quando ainda era preciso afirmar a genialidade de Hitchcock contra detratores que o consideravam um mero diretor comercial, jovens críticos como Claude Chabrol e François Truffaut puseram-se a tratar o mestre como autor maiúsculo.
Uma das recorrências estilísticas do autor Hitchcock era o que se costumava chamar de "culpabilidade intercambiável": o que importa não é o crime em si, nem quem o cometeu, mas a transferência simbólica da culpa.
Tal como nos filmes de Hitchcock, no thriller de Moll o assassino comete o seu crime em nome de um inocente que já não o é mais. Ambos tornam-se cúmplices. Harry é o ex-colega de escola que o protagonista do filme, Michel, encontra na estrada.
Quando jovem, Harry venerava os contos macabros de Michel, e, para redespertar o dom literário do amigo, ele começa a aprontar das suas. Sintomático o fato de os crimes de Harry serem cometidos em nome de uma nostalgia da adolescência: "Harry" não passa, afinal, de uma exploração imatura do universo hitchcockiano.

Harry Chegou para Ajudar
Harry, un Ami qui Vous Veut du Bien
 
Direção: Dominik Moll
Produção: França, 2000
Com: Laurent Lucas, Sergi López
Quando: a partir de hoje nos cines ABC Plaza Shopping, Belas Artes, Top Cine e Unibanco Arteplex



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