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ARTES
Maior mostra já realizada sobre o pernambucano abre hoje, para convidados, no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba
Brennand busca o horror na mitologia
MARI TORTATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CURITIBA
Um olhar desatento acreditará
estar diante de peças em ferro, ora
em madeira, pedra, cobre. No entanto, tudo tem origem na argila e
ganha forma de figuras mitológicas e dramáticas nas mãos do escultor Francisco Brennand, 77.
O artista pernambucano abre
hoje no Museu Oscar Niemeyer,
em Curitiba, a maior exposição
fora de seu ateliê, que está transformando em museu, em Recife.
São 204 esculturas em cerâmica
terracota e 13 telas preparatórias
distribuídas por três salões. As peças contam a trajetória do artista,
que dá destaque ao que chama de
"a representação do horror". "É
num grito contra a violência", define. A sensação do horror, diz,
não está presente apenas nos livros que devora.
"Não estamos passando por um
período anômalo. As notícias do
horror de hoje estão na mídia, que
se encarrega de carregar nas tintas", diz Brennand. Um personagem presente na inspiração cotidiana do escultor é o presidente
dos Estados Unidos, George W.
Bush, "o nosso diabinho em pessoa". Para Brennand, que diz ter
lido toda a biografia sobre Bush,
"ele é uma figura muito mais perigosa do que qualquer terrorista".
Identificado como artista com
obsessão em retratar símbolos sexuais, classificação que ele rejeita,
Brennand diz que sua criação é
toda baseada no enigma da existência. "Talvez esteja aí a razão de
eu reproduzir tanto o ovo, um
emblema de eternidade. E os ovos
são eternos porque se reproduzem, o que nos remete ao enigma
da sexualidade."
A distribuição das obras pelo
museu começa com duas personagens mitológicas -as deusas
Ligia e Leuconia, castigadas por
Afrodite-, inspiração resultante
da leitura de "Odisséia". Os pássaros rocas, recorrentes no trabalho
do escultor, assim como os gansos do Capitólio com pés de humanos, "guardam" a exposição.
A representação mais evidente
do horror, no entanto, está presente em 30 figuras de caveiras
destroçadas que guardam as esculturas dos últimos imperadores
das civilizações inca (Ataualpa) e
asteca (Montezuma 2º). Brennand diz que elas foram criadas
ao acaso. "A primeira peça foi um
acidente. Ela ficou danificada porque virou no forno, e então me
veio a idéia."
Um "Calígula" que chora, a figura do conhecimento representada por "Gnose", o "Cavalo de
Tróia" só com pescoço e cabeça, a
"Árvore da Sobrevivência", a figura trágica e bela de "Lara" são
outros destaques da exposição.
No caso de "Lara", Brennand
conta que brigou com o forno para conferir dramaticidade à figura, mas que foi uma gota escura
caída ao acaso do teto do ateliê sobre o rosto da escultura -tomando a forma de uma lágrima- que
definiu o trabalho.
Há casos também em que a inspiração tem a ajuda dos operários
da cerâmica comercial da família,
contígua ao ateliê. "Eles se habituaram a essas formas e, de vez
em quando, me dão de presente
um pedaço de madeira ou uma
pedra de forma estranha." A "Árvore da Sobrevivência" foi inspirada nesses presentes.
O curador da mostra, Emanoel
Araujo, 64, próximo secretário da
Cultura da cidade de São Paulo,
conta que as peças expostas somam 23 toneladas. O peso dos
trabalhos em cerâmica é a principal razão de a exposição ocorrer
após dois anos e meio de negociação. Mas é a criação o que importa. Para o curador, ao esculpir,
Brennand "se aproxima da criação divina do Gênesis".
O HOMEM E A NATUREZA. Mostra do
artista Francisco Brennand. Curadoria:
Emanoel Araujo. Onde: Museu Oscar
Niemeyer (r. Marechal Hermes, 999,
Centro Cívico, Curitiba, tel. 0/xx/41/350-4400). Quando: abertura hoje (apenas
para convidados); de ter. a dom., das 10h
às 18h30; até 31/3. Quanto: R$ 4.
Patrocinadores: governo do Paraná,
Copel, Sanepar, Ministério da Cultura e
Clear Chanel.
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