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Emissoras vivem clima de guerra
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
De um lado, o presidente ameaçando cassar as concessões. De
outro, as TVs transformando seus
telejornais em porta-vozes da
oposição ao governo.
Na Venezuela, esse cenário potencializa a crise que envolve a
gestão de Hugo Chávez.
O conflito entre os maiores grupos de comunicação e a presidência é grave desde 2002. Em abril, o
presidente os acusou de terem colaborado com o golpe que o depôs
por cerca de 48 horas e, em tom
ameaçador, disse, ao retomar o
poder, que o "Estado pode ou não
dar concessões".
A ameaça se fortaleceu nos últimos dias com a elaboração da Lei
de Conteúdos, que tornaria obrigatória uma programação "educativa e revolucionária". Anteontem, Chávez afirmou no "Alô,
Presidente", seu programa semanal de rádio e televisão, que a regra visa "proteger crianças e adolescentes dos abusos dos meios,
em especial dos quatro cavaleiros,
que tem perturbado a tranquilidade dos venezuelanos".
O presidente se refere à Globovisión, Venevisión (do grupo Cisneros, um dos mais poderosos da
América Latina), RCTV e Televén, apelidadas por ele de "quatro
cavaleiros do apocalipse" por
"propiciarem ações golpistas".
No programa, disse ainda que a
criação da lei é "parte da ofensiva
revolucionária contra a atuação
discriminatória e racista dos donos dos meios de comunicação".
O governo também está multando as emissoras por diversas
razões. A Globovisión, por exemplo, foi autuada na semana passada em US$ 34 mil por supostamente não ter pago impostos. Sua
sede e a de outras já foram atacadas por defensores de Chávez e
hoje estão cercadas por arame farpado e seguranças armados.
Os canais, por sua vez, além de
atacarem sistematicamente o grupo político de Chávez, chegaram a
se recusar a noticiar fatos considerados positivos para o governo.
O caso mais notório foi em 2002,
quando tentaram omitir a volta
de Chávez ao comando do país.
Durante a greve geral, interromperam a programação normal para noticiar exclusivamente a paralisação. Intervalos comerciais foram substituídos por propagandas da Coordenação Democrática
(reunião de partidos e organizações de oposição), acusando o
presidente de "mentiroso", "assassino" e "fracassado" e pedindo
a antecipação do referendo sobre
a manutenção de Chávez, previsto para agosto deste ano.
Leia abaixo trechos da entrevista que Oswaldo Quintana, vice-presidente corporativo de Assuntos Legais da RCTV e do Comitê
Permanente de Liberdade de Expressão da (AIR) Associação Internacional de Radiodifusão, concedeu por e-mail à Folha.
Folha - Chávez ameaçou cassar
concessões dos veículos contrários
a ele. Como está essa situação?
Oswaldo Quintana - Está muito
grave. O presidente está utilizando procedimentos administrativos, judiciais e tributários para justificar sua decisão de cercear a
liberdade de pensamento e informação na Venezuela. Agora, há
um procedimento aberto pelo ministro da Infra-estrutura que invoca normas de desacato e outros instrumentos jurídicos inconstitucionais com os quais se pretende suspender ou revogar as permissões para as TVs operarem.
Folha - Quantos por cento das rádios e TVs estão na oposição?
Quintana - Só as públicas, que
dependem diretamente do governo, e as ilegais, que têm inclusive
incitado a violência contra os
meios privados, se pronunciam a
favor de Hugo Chávez. Uma
imensa maioria está lutando pela
democracia na Venezuela.
Folha - O fato de as redes terem
omitido a volta de Chávez ao poder
em 2002 e o discurso que ele fez à
época não tira a credibilidade de
seu jornalismo? Não teriam obrigação de ter noticiado esses fatos?
Quintana - Os meios estão, mais
do que nunca, ligados aos venezuelanos e à comunidade internacional. Sempre nos caracterizamos pela luta pela verdade e contra as arbitrariedades do poder.
Nunca fomos amigos do governo
da vez. O que nos diferencia agora
é que enfrentamos um governo
que saiu dos limites da democracia. Já não se trata, portanto, de
cobrir a gestão de um governo
normal, mas de enfrentar um regime autoritário que causou danos imperdoáveis ao país.
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