São Paulo, quinta-feira, 18 de abril de 2002

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SHOW/CRÍTICA

Djavan rodopia entre o músico certeiro e o sedutor barato

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

O final de semana passado foi de catarse no palco do DirecTV Music Hall, e a cena deve voltar a se repetir amanhã, quando começa a segunda das três semanas de temporada do músico alagoano Djavan, 54, na casa.
Lotada de mulheres, a platéia protagoniza segundo show, dessa vez de adoração, aqui e ali quase de histeria. Cinquentão, Djavan é o terror de garotas das mais variadas idades, de pós-adolescentes a senhorinhas.
À saída de um dos shows, uma das fãs exaltadas que estiveram, suplicantes, na boca do palco no bis, descreve e justifica espontaneamente o fenômeno: "Ele seca a mulherada, dá a mão, olha no olho, dá a mãozinha, sorri, faz cara de tarado...".
Ou seja, elas morrem de emoção. Até mesmo quando ele canta que "quem sofre de véspera é peru", entre outros versos constrangedores da sofrível "Que Foi My Love" (96).
E, nesse contexto, a música, que é a atividade lucrativa e criativa de Djavan, vira show à parte, fundo de cena para um jogo erótico em que o astro rodopia, mostra premeditadamente o abdome, anda na ponta dos pés, faz cara de mocinho sem dono. Tudo é de um desajeito sem par, mas é isso mesmo que faz a loucura de uma legião de fãs sem par.
Cria-se um paradoxo de bom tamanho, porque quase todo mundo sabe que Djavan é belo harmonizador, excelente músico, cantor de domínio, e no entanto não é nada disso que cria o estado agudo de empatia que movimenta seu show.
"Se..." (92), aquela em que ele lamenta o fato de a moça "não decidir se dá ou não", é uma de suas grandes canções, caso raro na MPB de tema sofisticado que se ampara em temática loucamente popular e emocional. As moças cantam e gritam, pena que não exatamente por causa da sofisticação melódica de "Se...".
Outros exemplares de pura sofisticação arrancam suspiros cheios de segundas intenções: "A Rota do Indivíduo (Ferrugem)" (92), as novas "Milagreiro" (apesar da doída ausência de Cássia Eller) e "Ladeirinha"...
Movido por banda familiar e desocupada dos dotes jazzísticos que fizeram a fama (e o sucesso, será?) do disco "Ao Vivo", de 99, Djavan desfila seus deslizes lado a lado com aquelas anteriores, e... a moçada grita, apaixonada.
Aí não importa se o papo é aranha ("um dia frio/ um bom lugar pra ler um livro/ e o pensamento lá em você", corcoveia em "Nem um Dia", de 96), se a canção é arrastada e morna (a nova "Cair em Si", "Mal de Mim", 89), se a poesia é descuidada ("Eu te Devoro", 98, que parece escrita sob medida para galanteios baratos)...
Seja lá ou cá, Djavan seduz, e isso hoje em dia compõe sua figura artística de forma indissociável.
O perigo, de que esse artista não devia padecer nunca, é que o oba-oba tome a cena e seus shows musicais venham a se tornar "reality shows", em que o protagonista salta, joga malabares, assovia e chupa cana, em espetáculo pirotécnico -e a música (ou o sexo real, o que dá no mesmo) se amortece, zunindo lá no fundo.
Seria desperdício, porque afinal de contas Djavan vive, com "Milagreiro", um momento musical forte, que talvez não acontecesse desde o inspiradíssimo "Coisa de Acender" (92). É tanta coisa para pensar ao mesmo tempo...


Avaliação:   

MILAGREIRO - show de Djavan. Onde: DirecTV Music Hall (av. dos Jamaris, 213, SP, tel. 0/xx/11/5643-2500). Quando: amanhã e sáb., às 22h, e dom., às 20h (até 28/4). Quanto: de R$ 35 a R$ 80.




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