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FESTIVAL DE DOCUMENTÁRIOS É TUDO VERDADE
"H.I.J.O.S."
Uma história dos argentinos, de panelaço em panelaço
SYLVIA COLOMBO
EDITORA-ADJUNTA DA ILUSTRADA
"Escrachar" é trazer algo à
luz, algo feio, é denunciar
um crime. Quem explica isso à câmera no documentário
"H.I.J.O.S. - El Alma en Dos" é
uma jovem argentina, munida de
cartazes, pincéis e cola, numa fria
e úmida noite de Buenos Aires.
Com um grupo de rapazes e
moças de 20 e poucos anos, ela
prepara um "escrache", tradicional -e barulhento- ato de repúdio que os argentinos promovem contra responsáveis por torturas realizadas durante o regime
militar (1976-1983).
Num "escrache", cartazes são
afixados em locais próximos à casa do ex-torturador, denunciando
seus atos e avisando que ele será
"escrachado". Na noite escolhida,
jovens comparecem ao local com
cartazes, apitos e palavras de ordem -parece um panelaço, como os que tomaram as ruas de
Buenos Aires nos últimos dias do
presidente Fernando de la Rúa.
"H.I.J.O.S." é uma espécie de
"making of" de manifestações
contra ex-torturadores e de eventos promovidos por jovens para
relembrar parentes mortos durante a ditadura. A sigla (que, em
português, significa "filhos pela
identidade e justiça contra o esquecimento e o silêncio") dá nome a uma organização criada em
1995, que reúne filhos de pessoas
desaparecidas, exiladas ou mortas
no período e tem braços em várias
cidades argentinas e no exterior.
Segundo dados oficiais, cerca de
9.000 pessoas morreram ou desapareceram durante o regime militar. Já as entidades de defesa de
direitos humanos apontam para
um número maior, 30 mil.
O documentário é assumidamente panfletário, e seu mérito é
dar voz apenas aos jovens que integram a entidade e a seu discurso, que paira entre o idealismo, a
ingenuidade e o inconformismo,
numa tentativa de mostrar, com
um olhar benevolente, a maneira
como as idéias políticas amadurecem na Argentina de hoje.
Alguns discursam, outros se
perguntam o que é o perdão e a
quem devem perdoar, outros
buscam paliativos para o sofrimento, em cartas, fotos ou tateando entre lápides. Uma garota faz
colagens com fotos de filhos e
seus pais desaparecidos. "Era para ser um quebra-cabeças, mas a
imagem nunca ficava completa."
A câmera vaga por ruas vazias,
madrugadas, sarjetas, cemitérios
e fachadas com néons antigos que
se contrapõem a modernos orelhões iluminados da Telefónica.
"H.I.J.O.S." mostra por que, aos
olhos dos argentinos, ainda sobram motivos para os panelaços.
H.I.J.O.S. - El Alma en Dos
Direção: Carmen Guarini e Marcelo
Céspedes
Quando: hoje, às 20h, no Cinesesc (r.
Augusta, 2.075, tel. 0/xx/11/3082-0213)
Quanto: entrada franca
Veja a programação completa na Folha Online
(www.folha.com.br/ilustrada)
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