São Paulo, Sexta-feira, 18 de Junho de 1999
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LITERATURA
Novo livro explora o 007 alpinista

AMIR LABAKI
da Equipe de Articulistas

James Bond, quem diria, acabou alpinista. A terceira montanha mais alta do mundo, a Kangchenjunga, um dos picos com mais de 8.000 metros da cordilheira do Himalaia, entre o Nepal e a China, é a um só tempo o principal cenário e o maior inimigo da nova aventura de 007 em livros, "High Time to Kill".
O romance acaba de desembarcar nas livrarias americanas. É o terceiro assinado por Raymond Benson, sucessor de Ian Fleming e John Gardner. Benson vinha bem até aqui, recriando o agente secreto britânico com licença para matar neste fragmentando mundo pós-Guerra Fria.
O segredo de "Zero Minus Ten" (1997) e "The Facts of Death" (1998) era envolver Bond em violentas disputas regionais em ex-colônias britânicas. Benson provou ter poder descritivo similar ao de Fleming e inegável imaginação para enredos de suspense.
É precisamente este último elemento que falta ao novo livro. Bond enfrenta desta vez uma nova organização criminosa internacional, a "Union". Em torno dela girarão também os próximos dois romances.
A apresentação de estréia resultou por demais esquemática. Aprende-se que a nova sucessora da Spectre tem por chefe "Lé Gerant", por assinatura degolar suas vítimas e lucro por seu único princípio motor. E só.
A "Union" rouba dos britânicos a fórmula da pesquisa de um revolucionário revestimento para aviões hipervelozes. Um dos intermediários, o ex-agente chinês Lee Ming, acaba morto com ela em acidente de avião num dos topos do Himalaia. James Bond é então convocado a participar da expedição enviada para o resgate.
O grupo inclui, entre outros, Roland Marquis, um rival de Bond desde os tempos de colégio, a sensual médica Hope Kendall e um membro da força de elite britânica gurkha, formada por soldados do Nepal. Há, claro, um misterioso agente infiltrado pela "Union", de tempos em tempos responsável por um atentado contra 007.
Uma centena das cerca de 250 páginas do livro é dedicada à lenta escalada. "Inspirei-me em "No Ar Rarefeito" de Jon Krakauer", reconhece Benson. Na bela reportagem de Krakauer o desafio é o Everest, vizinho himalaiano do Kangchenjunga e cerca de 300 metros mais alto.
Benson preferiu o último. "O Everest não é tão mais alto e é muito mais fácil", leva Bond a dizer ao saber da nova missão. Scott McKee, o primeiro americano a escalar o Kangchenjunga até o topo pela face norte, serviu de consultor técnico a Benson.
"High Time to Kill" não deixa dúvidas de que o escritor fez bem a lição de casa. Pena que tenha se complicado ao aplicar dramaticamente o que pesquisou.
A aventura tem um começo promissor, com Bond conhecendo a "Union" no Caribe e seguindo seu rastro em Londres e Bruxelas. Ao se aproximar das montanhas, tudo se torna previsível, a partir das descrições preparatórias dos riscos da empreitada e dos equipamentos disponíveis.
Afirmando-se inspirado também em Hitchcock, Benson comete o mais anti-hitchcockiano dos pecados ao ocultar informações dos leitores para depois lançá-las num efeito fácil. E a surpresa, já ensinava o velho Hitch, nada tem a ver com o gênero mais nobre do suspense.
O escritor complica-se ainda ao entremear a ação com diálogos pretensamente filosóficos sobre vida e morte frente aos mistérios da natureza. Algumas das melhores páginas de Benson nos livros anteriores giravam em torno das pausas reflexivas de Bond, muito à moda dos originais de Ian Fleming. Desta vez, a banalidade se impôs -e a literatura bondiana conhece suas primeiras páginas de auto-ajuda. Que sejam as últimas.


Avaliação:   


Livro: James Bond, High Time to Kill Autor: Raymond Benson Lançamento: G. P. Putnam's Sons Quanto: US$ 23.95 (257 págs.) Onde encomendar: www.amazon.com

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