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MULTIMÍDIA
Allen Ginsberg
NELSON ASCHER
da Equipe de Articulistas
Judeu, gay, anarquista, drogado
e hippie, entre outras coisas -não
há minoria ou exceção da qual o
norte-americano Allen Ginsberg
(1926-1997) não tivesse feito parte
antes de morrer septuagenário.
Em praticamente todos os outros
países ou regimes do planeta, ele
teria, neste século 20, chegado ao
fim antes, provavelmente de modo
violento.
Nos EUA, ele foi celebrado como
o poeta mais famoso de seu país, e
as principais antologias de poesia
contemporânea -acadêmicas ou
vanguardistas, conservadoras ou
contestadoras- reservam-lhe um
lugar de destaque.
Os americanos apreciam muito a
Pablo Neruda e, sob certos aspectos, Ginsberg é o Neruda americano. É possível que o crítico Harold
Bloom aprovasse essa afirmação,
lembrando que o ponto de partida
do chileno -um outro americano, Walt Whitman- é o mesmo
que o de Ginsberg.
Mas, se o autor de "Canto General" fascina os anglo-americanos
com seu exotismo -"Era o crepúsculo da iguana..."-, o poeta
de "Uivo" lhes é tão familiar como o proverbial "apple pie".
A convergência de ambos está
mesmo na verborragia, na capacidade de acumular fatos, dados,
pessoas, coisas, o que quer que seja, em versos e mais versos, formando poemas e mais poemas que
são no fundo um único poema
ininterrompível, ou melhor, interrompido somente pela morte do
autor.
O melhor da poesia moderna se
caracteriza pela síntese, pela contenção e pelo controle. Além disso,
a tradição inglesa requer o "understatement", ou seja, dizer o essencial nas entrelinhas.
Ginsberg, com sua incontinência
total, faz parte, até mesmo nisso,
de uma minoria. O contexto cultural ao qual pertence e seu inesperado prestígio fazem dele uma minoria de um. Para todos os efeitos, ele
existe como um contra-exemplo.
Nem por isso seu desbordamento é mais fácil de ser traduzido do
que toda a sutileza de Eliot, Stevens, Williams, Pound.
O delírio da(s) gíria(s), das referências específicas, particulares e
frequentemente crípticas é uma
verdadeira dor de cabeça para
qualquer tradutor que, além da
imaginação, precisa frequentemente se valer da intuição e da adivinhação para se aproximar de um
resultado legível enquanto, do alto
de sua nuvem beat no outro mundo, o poeta deve rolar de rir do esforço dos pobres mortais.
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