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CRÍTICA CONTO
Ronaldo Correia de Brito testemunha Nordeste destroçado
Relatos agrupados em "Retratos Imorais" abordam com sarcasmo e sensibilidade a banalidade do homem
QUANDO OLHA O PRESENTE, SUA VOZ HESITA ENTRE A COMPAIXÃO E O DESCONSOLO, PRESTES A FAZER DA ESCRITA UMA MÁQUINA DE REDENÇÃO
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ALCINO LEITE NETO
EDITOR DA PUBLIFOLHA
O escritor Ronaldo Correia
de Brito é o primeiro a reconhecer que as histórias de
seu novo livro, "Retratos
Imorais", "não se prendem a
um modelo comum de narrativa que caracteriza o conto,
podendo assumir o formato
de ensaio, crônica, anedota e
até mesmo perfil biográfico",
como escreve no posfácio.
O livro traz 22 relatos, escritos em diferentes épocas
(alguns de 40 anos atrás, segundo o autor) e agrupados
em três partes: "Retratos Dispersos", "Retratos de Mães"
e "Retratos de Homens".
Apesar da unidade forjada
pela edição, há de fato uma
tal variedade de vozes, de
tons e de formas narrativas,
que o conjunto pode deixar a
impressão de que o escritor
apenas varreu a gaveta de
guardados, agrupando seus
papéis numa antologia de
ocasião, sem qualquer zelo.
É uma falsa impressão. E
para tentar provar o que escrevo, procuro o que "Retratos Imorais" podem me dizer,
no conjunto e nas partes, sobre o tempo em que vivo.
Praticamente todas as histórias falam de um mundo
que acabou: o Nordeste mítico da história e da cultura.
A força da literatura regionalista vinha da sua projeção
visionária e utópica, que se
esgotou. O Nordeste de Correia de Brito é um amontoado
de destroços, na memória e
na paisagem, na carne e na
psique e na própria escrita.
O interesse desse livro está
na sensibilidade do autor para testemunhar, em toda parte e por meio de diferentes
dispositivos de narração, esse mundo destroçado.
E identificar aí uma experiência que não é só local,
mas universal, em que "explodiram valores e visões".
"Imoral", aqui, não significa apenas o avesso da decência, mas diz respeito à
nossa incapacidade de dotar
a vida de sentido.
Quando mira as ruínas da
infância no sertão, a escrita
de Correia de Brito se impregna de certa solenidade melancólica, com ecos bíblicos
-como se a literatura ainda
pudesse, de alguma forma,
consagrar a realidade.
Quando olha o presente, a
tragédia social e o desespero,
sua voz hesita entre a compaixão e o desconsolo, prestes a fazer da escrita uma máquina de redenção.
RIDICULARIAS
Mas o presente é feito sobretudo de ridicularias
-amigas que duelam por um
mesmo macho, homens que
pintam as unhas com esmalte transparente, amantes que
se engalfinham...
É justamente quando desiste de buscar a "solenidade
na ruína", revelando uma
veia quase satírica, que o autor de "Galileia" produz os
melhores contos: retratos
sem piedade deste mundo
banal, que é não só o Nordeste, mas o de todos nós.
RETRATOS IMORAIS
AUTOR Ronaldo Correia de Brito
EDITORA Alfaguara
QUANTO R$ 33,90 (184 págs.)
AVALIAÇÃO bom
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