São Paulo, quinta-feira, 18 de outubro de 2007

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Crítica/"Fay Grim"

Em continuação, Hal Hartley faz paródia "cool" de thriller

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

"Fay Grim" é uma espécie de continuação, dez anos depois, do sucesso independente "Confissões de Henry Fool", que em 1998 ganhou o prêmio de roteiro em Cannes e deu a Hal Hartley renome internacional. Os personagens são os mesmos do filme anterior, mas uma torção da história faz tudo mudar de registro e de gênero.
Eis, em três parágrafos, um resumo possível do imbróglio. No Queens, Nova York, a mãe solteira Fay Grim (Parker Posey) vê-se às voltas com um filho problemático, que acaba de ser expulso do colégio depois de ter mostrado aos colegas (e principalmente às colegas) um brinquedinho que exibe imagens pornográficas. Ela teme que o garoto siga os passos do pai, Henry Fool (Thomas Jay Ryan), que está desaparecido e foragido da polícia.
O irmão de Fay, o escritor Simon Grim (James Urbaniak), cumpre pena na cadeia por ter facilitado a fuga de Fool. O FBI acossa Fay por suspeitar que os manuscritos da autobiografia de Fool contêm mensagens cifradas a ser usadas por terroristas muçulmanos, com os quais ele teria se envolvido. Segundo os policiais, Fool está morto.
Forçada a colaborar com as investigações do FBI e da CIA, Fay vai a Paris e a Istambul, onde se envolve com gente misteriosa de todos os tipos de organização e passa a desconfiar que Henry Fool esteja vivo.
Nessa paródia dos filmes de espionagem, as próprias imagens supostamente obscenas (que nunca vemos) do brinquedinho do filho de Fay revelam-se, elas próprias, mensagens críticas, enviadas anonimamente pelo correio. Há aqui um jogo incessante de fundos falsos e pistas que não levam a lugar nenhum.

Ousadia
A crítica norte-americana, zelosa pela integridade dos gêneros narrativos, de um modo geral torceu o nariz para o filme de Hartley. Dá para entender. "Fay Grim" distende, pelo exagero rocambolesco e pelo distanciamento irônico, a gravidade tensa dos thrillers de espionagem, sem no entanto cair na sátira desbragada de um "Johnny English", um "Austin Powers" ou um "Agente 86".
Além disso, ousa mostrar terroristas islâmicos como gente de carne, osso, inteligência e boas intenções. Pode-se encarar os enquadramentos ligeiramente inclinados de Hartley, bem como os letreiros "godardianos" inseridos aqui e ali, como cacoetes de um certo cinema independente americano, feito mais de pose "cool" do que propriamente de invenção.
Mas vale mais a pena relaxar e se divertir com as tiradas surpreendentes do policial vivido por Jeff Goldblum ou com as trapalhadas da espiã acidental Fay Grim, que entre outras coisas guarda o celular no modo vibratório junto à virilha e, cada vez que recebe uma ligação, quase tem um orgasmo.


FAY GRIM
Direção:
Hal Hartley
Produção: EUA, 2007
Com: Parker Posey, James Urbaniak, Thomas Jay Ryan, Jeff Goldblum
Quando: amanhã, às 17h20, no Reserva Cultural 1; sábado, às 22h30, no Unibanco Arteplex 2; e dia 31, às 17h20, no HSBC Belas Artes 2
Avaliação: bom


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