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31ª Mostra de SP - Crítica/"Não Toque no Machado"
Aos 79, Rivette recria com energia duelo amoroso de Balzac
O diretor francês conta a história de uma paixão trágica em "Não Toque no Machado", adaptação de obra do escritor
ALCINO LEITE NETO
EDITOR DE MODA
É surpreendente que o
melhor cinema francês
continue a ser feito por
diretores, hoje anciãos, da antiga nouvelle vague. Os novos filmes de Eric Rohmer, Claude
Chabrol e Jacques Rivette são
todos eles notáveis e vigorosos.
Rohmer, 87, dá uma lição de
maestria e juventude espiritual
em "Os Amores de Astrée e Celadon". Chabrol, 77, faz uma
crônica demolidora da burguesia parisiense em "A Mulher
Cortada ao Meio". E Rivette,
aos 79, encarou com bastante
energia a adaptação do romance de Balzac "A Duquesa de
Langeais" no filme "Não Toque
no Machado" (2006), que passa
a partir de amanhã na Mostra.
"A Duquesa de Langeais" é o
segundo livro da "História dos
Treze", conjunto de três novelas escritas por Balzac entre
1833 e 1835 -as outras são
"Ferragus" e "A Menina dos
Olhos de Ouro". Todas têm em
comum uma confraria de amigos dispostos a tudo para ajudarem uns aos outros.
Segundo o tradutor Paulo
Rónai, o livro "é a história de
um duelo entre uma mulher faceira e o seu apaixonado", uma
trama de dois movimentos.
No primeiro, Antoinette de
Langeais, casada, seduz o general Armand de Montriveau, um
pouco por diversão, um pouco
por exibicionismo, levando-o
ao desespero, por ela não querer nem poder retribuir na
mesma moeda amorosa.
No segundo movimento, Antoinette se descobre vítima de
uma paixão furiosa pelo general, que, por vingança, resolve
submeter a duquesa a uma tortura emocional semelhante a
que ele sofreu.
Flashback
A novela começa numa ilha
espanhola, onde o general
reencontra a duquesa, enclausurada num convento. Faz um
flashback para contar a história
desse amor desencontrado e
retorna à ilha para o desfecho
trágico. Rivette seguiu a mesma
ordem narrativa.
O diretor se concentra no
principal do livro: o orgulho e a
insegurança da nobreza da Restauração, o ressentimento
amoroso e a guerra dos sexos
expressa nos "combates verbais" (Rónai) da duquesa e do
general (os ótimos Jeanne Balibar e Guillaume Depardieu).
O diálogo belicoso, muito
bem adaptado, aproxima o filme do teatro, deslocamento
que tanto atrai Rivette. Mas é
outra a principal exploração cinematográfica de "Não Toque
no Machado" -primeiro título
dado por Balzac a seu livro.
O filme é construído como
um estratagema de lugares fechados (as casas, os salões, os
quartos, o convento...) que os
amantes invadem e ocupam,
onde eles se exibem, brigam e
se ocultam, levando a disputa a
se estender do diálogo ao espaço, da fala ao olhar. Com perfeito domínio dos planos, o diretor Jacques Rivette exibe as táticas do amor como uma perversa geopolítica da visão.
NÃO TOQUE NO MACHADO
Direção: Jacques Rivette
Quando: amanhã, às 21h30, no Unibanco Arteplex 3; sáb., às 13h30, no
Espaço Unibanco, e domi., às 21h,
no Memorial da América Latina
Avaliação: ótimo
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