São Paulo, sexta-feira, 18 de novembro de 2005

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Diretor refuta acusação de suborno

DA REPORTAGEM LOCAL

Uma exposição que não houve e dois diretores de museus com opiniões inconciliáveis.
Eram esses os ingredientes do maior incidente (até aqui) na programação do Ano do Brasil na França. Eram. Uma denúncia não-comprovada de tentativa de suborno publicada pelo jornal "Le Monde" na última sexta deu ao episódio o contorno de polêmica internacional.
O fato: a exposição de obras do artista brasileiro Arthur Bispo do Rosário (1911-1989) programada para o museu Halle Saint Pierre, em Paris, foi cancelada três semanas antes de sua abertura, prevista para setembro passado.
Versão do "Le Monde" atribuída à diretora do museu Halle Saint Pierre, Martine Lusardy, diz que "o diretor do museu situado no hospital do Rio onde o artista fora internado exigia uma comissão". Acrescenta o jornal: não menos do que 55 mil (R$ 141 mil).
Lusardy se recusou a confirmar à Folha a denúncia sobre a suposta cobrança de comissão por Aquino. "Nem eu nem o governo francês queremos polemizar em torno disso. Só lamentamos que a obra de Bispo do Rosário não tenha sido apresentada na França e tenha ficado refém de um debate alheio à esfera artística."
A afirmação sobre a suposta cobrança de comissão feita ao jornal francês enfureceu o psicanalista Ricardo Aquino, diretor do museu Bispo do Rosário. Foi Aquino quem negociou a ida (frustrada) das obras a Paris.
"Essa verba citada pela diretora francesa exprime o custo, em parte, do projeto. Esse nunca seria um dinheiro que viria para mim, nem para meu uso pessoal, nem mesmo para eu administrar", diz Aquino, em carta de seis páginas enviada à Folha, na qual detalha os termos da negociação.
Em entrevista, Aquino afirma que sua decisão de cancelar a exposição foi tomada depois que "houve um problema de confiabilidade, porque ela [Lusardy] adulterou o valor de seguro das obras, pondo muito menor do que tínhamos estabelecido. E ainda editou, sem autorização, um livro com imagens e textos nossos".
O diretor do museu Bispo do Rosário ressalta que também há uma polêmica conceitual, pois Lusardy classifica o trabalho de Bispo como arte bruta, expressão da qual discorda.
Lusardy afirma que Aquino "provavelmente não fala bem francês e fez uma confusão lingüística que o impediu de distinguir a avaliação das obras constante no seguro e o valor da apólice". "Ao contrário do que ele diz, fizemos um seguro superior ao que ele havia sugerido."
Sobre a classificação da obra de Bispo do Rosário como arte bruta, a diretora do museu afirma tratar-se de "um debate filosófico, que não impede a realização de uma exposição".
Aquino estuda levar o caso à Justiça. Disse já ter constituído um advogado para preparar uma ação de ressarcimento de direitos de imagens e de direitos autorais, já que cabe ao museu cuidar do acervo de Bispo -que não deixou herdeiros.
O comissário brasileiro do Ano do Brasil na França, André Midani, afirma que Aquino jamais pediu dinheiro ao governo brasileiro para autorizar a mostra.
"Desde o início, eles [do museu Bispo do Rosário] colocaram dificuldades. Tivemos a impressão de que estavam incomodados. A mim, ele não pediu dinheiro, mas a ela [Lusardy], parece que pediu". Aquino avalia "a observação do sr. Midani como a de um moleque leviano". "Moleque, porque ele busca, por intermédio dessa declaração, imputar à minha pessoa a não-realização da exposição, eximindo-se de sua responsabilidade. E leviano, pois [a acusação] é mentirosa e infundada."


Colaborou a Sucursal do Rio

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