São Paulo, sábado, 19 de janeiro de 2002

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Centenário de nascimento de Carlos Drummond de Andrade expande o universo criado pelo poeta para teatro, cinema, museus, CDs...

Mundo, mundo, vasto mundo

CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando ele nasceu, um anjo desses que vivem na sombra sussurrou em seu ouvido: vai, Carlos, ser o maior poeta do Brasil.
Se ainda existe alguma pedra neste caminho, ela tem tudo para ser removida em 2002. No ano do centenário do nascimento de Carlos Drummond de Andrade, seus versos, e também sua prosa, ganham uma difusão inédita em território brasileiro.
Vai ter Carlos em livros, muitos deles, em museus, teatros, telas de cinema, internet, selos, aparelhos de CD e até no ar, onde iniciam as comemorações.
No próximo dia 30, sobe ao céu carioca da confluência de Copacabana e Ipanema, praias entre as quais vivia o poeta, um balão de ar quente levando cartazes com alguns de seus versos mais famosos.
Dentro da cestinha vai o artista gráfico e cenógrafo Pedro Drummond, 42, neto do poeta e principal artífice dos festejos.
"Por um lado, acho que o Carlos não teria concordado com tanta homenagem. Ele não se acharia merecedor de tanta dedicação. Diria que existem outras prioridades para o país", diz Pedro. "Mas a cultura, como é sempre um dos últimos vagões, às vezes também merece atenção."
Um dos três filhos de Maria Julieta, única filha do poeta mineiro, Pedro supervisiona diversos projetos e coordena pessoalmente um deles, a reestruturação do website www.carlosdrummond. com.br, que ele mesmo lançou nos engatinhares da internet no Brasil, em 1996.
Ao lado de Drummond, o neto, está o mineiro César Piva, diretor da Paralelo 3, agência de marketing cultural que vem centralizando os principais projetos do centenário drummondiano.
Segundo Piva, a espinha dorsal da festança "sustenta" pelo menos "quatro vértebras". O projeto mais ambicioso é a digitalização de todos os textos feitos pelo escritor de Itabira.
A empreitada já está em curso. Discretamente, como pedia o objeto do trabalho, uma equipe de dez pessoas da Fundação Casa de Rui Barbosa (RJ), coordenada pela pesquisadora Eliane Vasconcellos, vem passando todo o arquivo do escritor, ali depositado, para os computadores.
Por enquanto, estão sendo digitadas apenas as crônicas, as mais de 6.000 que Drummond escreveu em diversos jornais do país, incluindo a Folha.
Os textos, a maior parte deles inédita em livro, vão compor o arquivo eletrônico chamado de Base CDA, que terá índices para as crônicas a partir de seus títulos, suas palavras, data, tema e referências nominais.
O acervo poderá ser consultado, futuramente, por meio da nova página de internet drummondiana, outra das tais vértebras das comemorações.
Enquanto o projeto não ganha visibilidade, uma terceira parte da "espinha dorsal" do centenário já está nas livrarias.
Seguindo roteiro preparado pelo próprio escritor pouco antes de sua morte, em 1987, a editora Record está reeditando todos os livros publicados por ele.
Já saíram, com revisão do texto, novo projeto gráfico e ensaios feitos por nomes como o crítico Silviano Santiago, o pioneiro "Alguma Poesia", de 1930, e outros sete títulos. Mais sete volumes devem ser lançados até outubro, mês do centenário.
No dia 31 desse mês, dia do nascimento, deve ser inaugurada a grande homenagem museológica ao poeta. Com curadoria da escritora e antropóloga Lélia Coelho Frota, abre no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio, a exposição "Sentimento do Mundo" (sem perder a conta, essa seria a quarta vértebra).
"A mostra partirá da poesia, e não da biografia de Drummond. A idéia é familiarizar novas gerações com sua poesia", diz a curadora, que enfatiza a variedade linguística que será empregada na mostra: "Usaremos recursos gráficos, cinematográficos, objetos, pinturas, esculturas, fotografias".
Correndo em paralelo a essa espinha dorsal estão outras atividades de porte. Com encorpadas 2.000 páginas será lançada em março, por exemplo, uma edição revista e ampliada da "Poesia Completa" de Drummond, realizada pela Nova Aguilar.
"É a primeira verdadeira edição da poesia completa", diz Sebastião Lacerda, diretor da editora, que promete para agosto uma versão revisada da prosa drummondiana.
A prosa e verso do homenageado também vira revista. César Piva, da Paralelo 3, está à frente do projeto da revista "Carlos".
A publicação, que em um número experimental (já em circulação) diz que será "um tabefe na cara da mediocridade", deve ser lançada em abril, com ensaios sobre Drummond e com a programação do centenário.
"Não vamos descansar tão cedo. Cada dia chega o relato de alguma peça de teatro, um espetáculo de dança, inúmeros CDs sendo feitos por todo o país."
O "mundo mundo vasto mundo", sobre o qual Drummond falava em "Poema de Sete Faces", o primeiro poema de seu primeiro livro, continua em projeto de expansão.


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