São Paulo, sábado, 19 de janeiro de 2002

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ARTES PLÁSTICAS

Após dez anos à frente da Pinacoteca, transformada em referência internacional, diretor deixa o museu

"Foi Rodin quem me escolheu", diz Araújo

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Há quase dez anos, em meados de 92, Emanoel Araújo, recém-empossado como diretor da Pinacoteca do Estado, abriu sua primeira exposição no cargo. "Vozes da Diáspora" reuniu, na abertura, 70 pessoas, em meio à então acanhada sede do museu.
Amanhã, quando transmitir seu cargo ao novo diretor da Pinacoteca, Marcelo Araujo, Emanoel Araújo, 61, entrega um museu completamente restaurado, com prestígio internacional, cujos vernissages reúnem, em geral, mais de 5.000 pessoas.
Para tal transformação, Emanoel Araújo, também escultor, contou com a ajuda de outro colega: o francês Auguste Rodin (1840-1917). Foi com Rodin que se iniciou o ciclo das megaexposições no Brasil e, com seu prestígio, a Pinacoteca conquistou as reformas necessárias.
"Eu e Rodin temos uma relação muita estranha, ambos somos de escorpião, ele nasceu exatamente cem anos antes de mim e foi ele quem me escolheu", diz Araújo.
Em 94, o diretor do museu Rodin, Jacques Vilain, veio ao Brasil selecionar um museu paulista para apresentar obras de sua instituição. Alguns dias depois da visita, Araújo recebeu um telegrama de Vilain com curto teor: "Escolhi seu museu porque esta seria a escolha de Rodin". Estava assim selada uma relação que marcaria os destinos da Pinacoteca.
A exposição de Rodin estava marcada para agosto de 95, mas a Pinacoteca ainda não tinha passado pelas reformas. Foi quando Araújo teve uma idéia: "Vou reformar a Pinacoteca toda no fiado", recorda-se.
O diretor comprou tintas e materiais, montou as bases para receber as esculturas, tudo sem dinheiro. "Quando o Vilain chegou, no dia da abertura, mudou apenas uma obra de lugar e disse que tinha confiado a exposição a mim, pois eu era escultor", lembra-se.
Foi assim o início da era Rodin na cidade. A mostra levou mais de 150 mil visitantes à Pinacoteca, público suficiente para pagar os gastos da exposição. A reforma que mudaria a cara do museu aconteceria somente depois, em 97, com projeto de Paulo Mendes da Rocha. Depois, outras duas exposições de Rodin foram realizadas, a última no ano passado, que, desta vez, superou a primeira mostra, com 220 mil pessoas.
Ao contar tais fatos à Folha, Araújo fechou os olhos por várias vezes para esconder as lágrimas que não paravam de jorrar. Tristeza pela saída? "Não é tristeza, estou satisfeito pelo meu trabalho, o museu está pronto, agora serei um consumidor, e ai se eu encontrar um banheiro sujo", sorri, finalmente.
Sua agenda já está cheia para os próximos meses. Araújo é responsável pelo desenvolvimento do conceito do Museu do Imaginário do Povo Brasileiro, que será inaugurado em abril na antiga sede do Dops, ao lado da Sala São Paulo. "Trabalho só no conceito, será um museu que faz falta na cidade. Um espaço que vai representar a construção do imaginário brasileiro, com uma perspectiva histórica", conta.
A carreira de escultor, prejudicada pela dedicação à Pinacoteca, também ganha espaço neste ano. Araújo está preparando uma exposição para o Instituto Cultural Tomie Ohtake, com um projeto parado há 20 anos, uma instalação para Oxalá. "Será a síntese de meu trabalho", afirma.
Araújo prepara ainda uma exposição que irá circular pela Espanha, no segundo semestre, chamada "Brasil Ardente e Barroco". A abertura é em Salamanca, capital cultural da Europa em 2002, ao lado de Bruges (Bélgica).
Nos últimos dias, Araújo tem sido cotado para secretário de Estado da Cultura. "Quero ficar independente, chega de cargos, agora estou livre", diz o escultor.



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