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CD revive missão de Mário de Andrade
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Senhorinha Freire tinha 20 anos
quando passou por sua Tacaratu
-cidade do sertão pernambucano- a Missão de Pesquisas Folclóricas enviada por Mário de Andrade. Em 2004, com 86 anos e
morando em Jaboatão, perto da
capital, ela pôde ouvir pela primeira vez a voz juvenil com que
registrou canções tradicionais em
1938 e, ainda, regravar essas canções e apresentar outras.
Tudo isso foi possível graças a
um projeto do pesquisador Carlos Sandroni, 46, carioca que dá
aulas no Núcleo de Etnomusicologia da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Com patrocínio da Petrobras e apoio da
Fundação Vitae, ele e sua equipe
voltaram a cidades de Pernambuco e da Paraíba visitadas pela histórica missão, que era integrada
por Luís Saia, Martin Braunwieser, Benedicto Pacheco e Antônio
Ladeira -Mário de Andrade, então diretor do Departamento de
Cultura de São Paulo, não viajou.
Parte do resultado está em "Responde a Roda Outra Vez", dois
CDs com uma hora cada um que
vêm encartados num robusto catálogo, no qual estão as letras das
57 faixas, além de textos e comentários assinados por Sandroni e
pelos professores Maria Ignez
Novais Ayala e Marcos Ayala, da
Universidade Federal da Paraíba,
parceiros no projeto.
O livro-CD é lançado hoje, no
Centro Cultural São Paulo, com a
participação de Eduardo Silvestre
e Fenelon Dantas (Paraíba), e do
grupo Samba de Coco Raízes de
Arcoverde (Pernambuco).
É uma chance para comprá-lo,
já que ele não terá grande distribuição comercial. Da tiragem de
3.000 exemplares, dois terços estão indo para bibliotecas e escolas
públicas e para as pessoas que
gravaram temas tradicionais de
suas comunidades.
"A idéia não era fazer uma missão que registrasse as músicas e
depois cortasse os laços com a
cultura local. Queríamos propiciar benefícios às comunidades",
conta Sandroni.
Quem participou das gravações
foi remunerado, o que permitiu
ganhos sociais como o de um homem que comprou uma geladeira
e hoje vende comida. Um outro
projeto paga a antigos mestres para ensinar a jovens como tocar
sanfona e outros instrumentos.
"Ao mostrarmos os registros de
38 e fazermos novas gravações, as
pessoas se sentiram parte de uma
história importante. Os CDs servem para que os filhos ouçam o
que os pais cantavam e repassem
para seus filhos", diz Sandroni. A
festa de São Gonçalo, registrada
pela missão na pernambucana
Tacaratu, foi gravada em Santa
Brígida (Bahia) para o projeto.
Ele está empenhado para que as
comunidades possam receber direitos autorais pelas canções que
foram produzidas nelas, mas cuja
autoria hoje é desconhecida. "É
preciso criar mecanismos de proteção jurídica", defende.
Além de Senhorinha Freire, a
equipe do projeto localizou outro
remanescente da missão: o paraibano Biu Saloia. E encontrou gente mais nova que não canta mais
as músicas tradicionais, mas que
as têm em algum lugar da memória. É o caso do filho de um cantador de coco que, ao ouvir a voz do
pai gravada em 38, começou a se
lembrar do que o pai cantava.
O coco é um dos gêneros que,
registrados há 67 anos, continuam fortes no Nordeste, segundo Sandroni. A embolada, o reisado e o congo são expressões que
também não se perderam.
Já tradições a que Mário de Andrade dava grande importância,
como o canto dos carregadores de
piano e o canto dos trabalhadores
de pedra, perderam-se junto com
as profissões ou se fundiram com
outras tradições.
"A missão seguiu o pensamento
de Mário e privilegiou os cantos
rurais, os rituais afro-brasileiros,
as danças dramáticas. Com manifestações que eles já achavam
"misturadas", menos "puras", eles
parecem ter ficado um pouco decepcionados", afirma.
Arcoverde (PE), Areia (PB), e
Cajazeiras (PB) são outras das cidades visitadas pela missão e revisitadas por Sandroni. Seu próximo projeto é refazer gravações
nas capitais do itinerário de 38:
Recife, João Pessoa (PB), São Luís
(MA) e Belém (PA).
Ele ainda quer catalogar e disponibilizar para consulta as mais
de 20 horas de gravação que estão
na UFPE. Nunca lançados em CD,
os registros da missão podem ser
consultados na discoteca Oneyda
Alvarenga, no Centro Cultural
São Paulo.
RESPONDE A RODA OUTRA VEZ.
Lançamento: hoje, às 19h, na Sala
Adoniran Barbosa do Centro Cultural São
Paulo (rua Vergueiro, 1000, Paraíso, tel.
0/xx/11/3277-3611). Quanto: R$ 60.
Como encomendar: 0/xx/81/2126-8597
ou anitafreitas@yahoo.com.
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