São Paulo, domingo, 19 de fevereiro de 2006

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COLEÇÃO

Caixa "Cinema Avant-Garde" reúne filmes de Man Ray e Marcel Duchamp

Curtas-metragens vêem cinema como arte plástica e musical

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Muita gente hoje em dia (incluindo alguns, digamos, críticos) pensa que cinema é sinônimo de relato audiovisual de uma hora e meia ou duas, com início, meio e fim (nessa ordem), privilegiando a continuidade, a clareza e a verossimilhança.
Escravizados a esse molde, filmes são meras ilustrações de histórias que poderiam ser contadas de outra maneira (num livro, por exemplo).
Mas o cinema pode ser muito mais do que isso, conforme atestam os curtas-metragens reunidos nos quatro DVDs da recém-lançada caixa "Cinema Avant-Garde". São 31 filmes realizados entre a década de 1920 e o ano 2000, com duração variada. O mais curto deles tem dois minutos; o mais longo, 40.
Entre os realizadores, há cineastas propriamente ditos, como Sergei Eisenstein, Joris Ivens e Jean Epstein, ao lado de artistas de outras áreas que experimentaram o cinema como meio de expandir seu instrumental expressivo: o pintor Fernand Léger, o fotógrafo Man Ray, o multiartista Marcel Duchamp etc.
Da vanguarda francesa dos anos 20 (Léger, Duchamp, Germaine Dulac) à vanguarda americana dos anos 40 em diante (Maya Deren, D. A. Pennebaker, Stan Brakhage), são inúmeros os estilos e as técnicas exercitados. O que há em comum entre todos é a experiência cinematográfica como arte essencialmente plástica e musical, em oposição ao uso servilmente narrativo do cinema comercial.
Dentro dessa diversidade, há os artistas que apostam mais no lúdico -como o Marcel Duchamp de "Anemic Cinéma", construído em torno de trocadilhos visuais e jogos anagramáticos-, outros que acentuam o poético -como o Man Ray de "L'étoile de Mer" e a Germaine Dulac de "La Coquille et le Clergyman"-, outros ainda que investem no ensaio documental, como o surpreendente "Le Vampire", de Jean Painlevé, filme sobre morcegos da América do Sul.
Todos os curtas citados acima, bem como o "Ballet Mécanique", de Léger, e "Regen", de Ivens, são freqüentemente citados como obras-primas do cinema experimental. Mas há na coletânea pérolas menos conhecidas, como "Daybreak Express" (1953), de Pennebaker, e "Forbidden", realizado em 1978 por Clive Barker, que depois faria sucesso com filmes de terror ("Hellraiser", "Nightbreed").
O curta de Pennebaker é um breve ensaio com a câmera a bordo do metrô de superfície de Nova York. O próprio movimento do trem, ao som vibrante de Duke Ellington, produz inesperadas composições visuais da cidade, no limite da abstração.
Em "Forbidden", o que impressiona é a beleza das imagens de corpos humanos filmados em preto-e-branco e exibidos em negativo, configurando uma espécie de poética do macabro.
Pena que esse tesouro todo não tenha recebido o cuidado que merecia na transposição para o DVD. Além da qualidade técnica da gravação ser precária, os extras se limitam a textos sobre os diretores. Há informações erradas e a tradução das legendas comete erros primários. Em suma, um desrespeito.


Cinema Avant-Garde     
Diretor:
vários
Distribuidora: Magnus Opus (R$ 160, em média; box com quatro discos)



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