São Paulo, Sexta-feira, 19 de Fevereiro de 1999
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Debates pouco esclarecem

do enviado a Madri

Debates sobre arte contemporânea não costumam ser esclarecedores. A aridez e a fluidez do tema e o olhar pessoal que se espera de cada espectador fazem com que a discussão não avance. Não foi diferente na Arco, que procura iludir seus frequentadores com a idéia de que uma feira absolutamente comercial como ela também tem seu lado erudito.
As possibilidades para isso até existiram, como na última segunda, quando se reuniram em uma mesa os curadores Guy Brett, Carlos Basualdo, Okwui Enwezor e Russell Fergusson. O tema foi "Além da Geopolítica: Esforços Críticos para Repensar o Cânone Artístico", e a mediação ficou por conta da crítica de arte Mónica Amor.
O norte-americano Fergusson, curador do Moca-LA (Museum of Contemporary Art de Los Angeles), se mostrou o mais pertinente de todos. Disse que não acreditava no fim do cânone, já que além de ele se basear na exclusão e na dominação cultural, também comporta algum tipo de referência comum. "O trabalho de curadoria está ligado ao conceito de cânone. Na medida em que se escolhe alguma obra ou artista, se reestrutura algum tipo de cânone", disse.
Tocou assim em uma questão importante para o debate, que até o inviabilizaria. Como pode um curador questionar o conceito de cânone se ele próprio, em cada curadoria, busca a afirmação de algum tipo de cânone?
O crítico e historiador de arte inglês Guy Brett, conhecido por seu intenso envolvimento com a produção de artistas como Hélio Oiticica e Lygia Clark, apontou o Museu do Eco, criado pelo artista mexicano Mathias Goeritz, como símbolo de resistência ao cânone, ao não priorizar qualquer tipo de manifestação artística.
"Sonho com processos mais sutis para diferenciar ou aproximar artistas. Esse é o papel do curador, algo que o bom médico procura fazer com seu paciente", disse.
O argentino Carlos Basualdo preferiu se ater a dados históricos sobre a ideologia implícita na formação e exibição de uma coleção em um museu para negar assim sua suposta neutralidade. "A coleção de um museu é seu ideal de cânone", disse.
Okwui Enwezor não havia preparado nada para o evento e preferiu ater-se a questões como o "roubo colonial" de estéticas alheias e a necessidade de "novas subjetividades". (CF)


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