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ARTIGO
Os índios: uma só nação
ORLANDO VILLAS BÔAS
especial para a Folha
Os índios, sejam eles de qualquer
um dos quatro troncos linguísticos, quando analisados no seu
comportamento e visão do mundo, podem ser considerados como
uma só nação -embora se diferenciem na expressão linguística.
Seus ritos, seus cerimoniais, no
fundo e na forma, mostram os
mesmos valores. Há, num aspecto
geral, a mesma semelhança psicológica e temperamental. Os recursos da subsistência são colhidos na
mesma natureza, usando os mesmos processos.
Um dos traços mais marcantes
das sociedades indígenas, em seus
estágios de cultura pura, é não conhecerem nem sentirem a fome
como crise. Condição essa presente e assustadora no universo civilizado.
A cultura indígena, tal como as
de outras sociedades, é complexa.
Porém, em alguns aspectos, foge
da regra geral de outros povos
quando constatamos a não-existência de desníveis econômicos
que inexoravelmente criam faixas
sociais diferenciadas.
Numa sociedade indígena não
existem normas estabelecidas que
dêem a alguém a prerrogativa de
chefe ou líder do núcleo social.
Aquele chamado de cacique não
tem privilégios autoritários, mas
tão-somente os de conselheiro.
O chefe-conselheiro da aldeia,
quer seja de linhagem ou aquele
que o substitua, tem normas rígidas de comportamento. São comedidos, não falam nem riem alto,
não fazem gestos bruscos, não andam apressados e jamais vêm a
correr.
Donos absolutos da terra que dominavam, um dia a viram invadida. De braços abertos receberam
os invasores. E estes, sem saber, estavam ganhando um continente, e
aqueles, os índios, dando os primeiros passos rumo a um futuro
incerto, para não dizer trágico.
A convivência nascida do contato foi sendo desastrosa para o índio.
Castigo maior surgiu com o
"preamento", que consistia na tentativa do trabalho escravo. A nova
orientação que vinha sendo firmada pelos novos donos da terra era a
de integrá-los aos padrões da nova
sociedade.
Tal coisa passou a ser a viga mestra da política indigenista brasileira. E o testemunho dessa verdade
está posta aos nossos olhos com os
índios aculturados das áreas urbanas.
A fúria, contudo, da nova civilização, dona da terra, não precisa
mais do braço escravo do índio.
Não são poucos, porém, aqueles
que vêem uma nova fonte de ganho vendendo a cultura do índio
por meio do turismo.
Em meio a esse quadro trágico, é
formidável que possamos, hoje,
magnificamente assistir como
uma lembrança viva do passado
distante é a música hoje documentada, não pelos adultos, mas pelas
crianças, num CD chamado "Ñande Reko Arandu", produzido pela
Comunidade Solidária, do Projeto
Memória Viva Guarani, com o patrocínio da Secretaria de Estado da
Cultura por meio da Caixa Econômica Federal.
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