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OSCAR
``Segredos e Mentiras'' concorre aos prêmios de melhor filme, diretor, atriz, atriz coadjuvante e roteiro original
Mike Leigh filma ``a vida como ela é''
JEANNE WOLF
especial para a Folha
O cineasta britânico Mike Leigh é
conhecido por seus filmes originais e provocantes, especialmente
o controvertido ``Naked'', que lhe
valeu o prêmio de melhor diretor
no Festival de Cinema de Cannes,
além de algumas críticas por suas
abundantes cenas de nudez.
Agora Leigh parece ter dado um
passo em direção à aceitação mais
generalizada, com ``Segredos e
Mentiras'', um filme comovente,
indicado a cinco Oscar, sobre uma
jovem adotada em busca de sua
mãe biológica.
Folha - De onde você tirou a idéia
de ``Segredos e Mentiras''?
Mike Leigh - A idéia específica
de fazer um filme sobre adoção
veio de algumas pessoas muito
próximas a mim que viveram experiências de adoção. Mas o que
você vê em ``Segredos e Mentiras''
não tem nenhuma relação com os
casos específicos dos quais eu tinha conhecimento. Eu apenas os
usei como ponto de partida.
- Você acha que o filme emocionou pessoas que viveram experiências semelhantes?
Leigh - Acho que sim. Já ouvi
comentários de várias pessoas
adotadas que, depois de assistirem
ao filme, decidiram sair em busca
de suas mães naturais. Isso me comoveu muito. Espero que possa
modificar a vida das pessoas de alguma maneira. Para mim, o simples fato de pessoas terem me dito
``eu ri e chorei ao mesmo tempo''
mostra que o filme mexeu com
suas vidas.
Folha - Existe algo de muito universal na idéia de que todos nós
escondemos coisas uns dos outros
-de que nossas vidas são influenciadas, inevitavelmente, por segredos e mentiras.
Leigh - É um filme sobre identidade, sobre a necessidade comum
que temos de nos ligar aos outros e
compartilhar coisas com eles. Todos nós temos segredos e mentiras
em nossas vidas. Em última análise, a mensagem básica de ``Segredos e Mentiras'' é que você vive
melhor quando fala a verdade.
Folha - Você já disse, em outras
ocasiões, que mostra o mundo real
sem maquiagem. De seu ponto de
vista, isso parece incluir muita desesperança e amargura nas vidas
dos personagens que você apresenta. Como seus filmes são ambientados na Inglaterra, isso quer
dizer que você reflete uma condição especificamente inglesa?
Leigh - Com todo o devido respeito, não acredito que seja uma
condição exclusivamente inglesa.
Acho que não teríamos que nos
afastar muito desta sala para encontrar alegria, dor, sofrimento,
êxtase e toda espécie de outras
emoções. O mundo real é sobre isso. Acho que lido com sentimentos
e emoções, problemas e vivências
que fazem parte do que se pode
chamar de ``a vida comum''.
Folha - Seus filmes já foram chamados de sociorrealismo. Você,
acho, os chama de realismo intensificado. Em última análise, o que
acontece é que eles penetram nos
corações e nas almas do homem
comum. Quais são as raízes disso
em sua própria vida?
Leigh - Essa pergunta é difícil.
Falando nos termos mais básicos,
sou alguém que se criou num lugar
comum e deprimente -Manchester, Inglaterra, nos anos 40 e 50.
Nessa parte do mundo, a cultura
prevalecente é muito franca. Mas
não posso explicar ou justificar
porque minha preocupação é com
a maneira como nos sentimos, como vivemos e como nos relacionamos. Eu poderia fazer uma pergunta: por que outras pessoas fazem filmes sobre coisas que não
vêm de lugar nenhum? Eu apenas
faço filmes sobre a vida como ela é.
Folha - Sua abordagem é deixar
os atores improvisarem substancialmente durante um prazo extenso de ensaios, e desses ensaios
saem os diálogos e o roteiro. Essa é
uma maneira esperta de deixar
que os atores façam a maior parte
do trabalho em seu lugar?
Leigh - Se fosse, acho que meus
filmes seriam esculhambados, mal
costurados e pouco interessantes.
Você não poderia assistir a eles e
dizer ``este filme tem todas as características de um filme de Mike
Leigh''. É verdade que meu processo implica muito trabalho árduo
para todos, especialmente para
mim. Não é questão de deixar os
atores fazerem o trabalho todo,
mas de criar um ambiente criativo
de trabalho, em que eles possam
realmente explorar os personagens que representam.
Folha - A impressão que se tem é
que, dentro do contexto do cinema moderno, fazer meses de ensaios para depois desenvolver um
roteiro é um luxo.
Leigh - Tudo bem. Quem sente
isso não volta a trabalhar comigo.
Os atores que trabalham nos meus
filmes não sabem sobre o que será
o filme, não sabem qual vai ser seu
papel. Eles aceitam, simplesmente, com base na confiança cega. A
questão é: o que é um luxo? Com o
que você gasta seu dinheiro? Se você quer ter perseguições com helicópteros e carros, então tudo bem.
Ou você pode ter isso, ou pode ter
momentos ricos de humanidade e
emoção na tela.
Tradução de Clara Allain
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