São Paulo, sexta-feira, 19 de maio de 2000


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COMENTÁRIO

Roliúdi tem membros de gladiador

GILBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

O universo industrial e midiático de Roliúdi dá-se ao luxo de reeditar qualquer coisa: do distintivo de xerife à academia de musculação para homens.
O Roliúdi "mon amour", exportado para o mundo inteiro, é a marmita requentada, ou seja, a paródia pervertida do "make it new!", com o cineasta norte-americano Steven Spielberg no lugar do poeta Ezra Pound.
Houve uma época, início da década de 50, que alguns diretores intelectualizados reclamavam que o cinema era uma atividade masculina -homens filmando mulheres.
A história do cinema seria o olhar do homem sobre a mulher. Olhar que teria mostrado coisas bonitas em relação ao sexo frágil, mas também a feiura do pornô obsceno, fragmentando o corpo da mulher como mercadoria, que é hoje o prato do dia da TV e da publicidade.
O chamado "plano americano" já foi definido, do ponto de vista cinematográfico, como um enquadramento da cintura para cima, isto é, o revólver, o símbolo do pênis -enquanto as mulheres eram sempre focalizadas pelas pernas.
Na história do cinema dois temas se entrecruzam: o do sexo e o da morte.
Nos últimos 20 anos, a perspectiva do cinema de sucesso é mostrar o corpo do homem à imagem e semelhança da boçalidade de consumo, valorizando o tipo musculoso, peitudo, fortão, com braços e pernas de gladiador.
A moda masculina da malhação faz parte do simulacro da macheza sem virilidade, tal qual o sorriso da publicidade: os dentes não são para mastigar, mas para serem mostrados na vitrine da boca.
Nesse contexto, a receita da epopéia à Cecil B. De Mille é mais adequada do que um cineasta apaixonado pela história, como Dreyer.
Quanto ao espetáculo chapado, não há motivo de espanto por agradar tanto assim o grande público, pois tudo neste mundo pós-moderno tende ao "reality show": todo poder hoje se converteu em espetáculo.
O público espectador -de Nova York, Paris ou Taubaté- está correto ao pedir às imagens na tela: "Lie to me. Tell me something nice". Minta para mim. Diga-me alguma legal.
É assim que funciona a gramática do espetáculo no cinema, com ou sem a sedução da violência em baixo nível.
Irônico consigo mesmo -e sarcástico com os seus colegas- o cineasta Jean-Luc Godard falou e disse: "O cinema, como o cristianismo, não está baseado numa verdade histórica".


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