São Paulo, sexta-feira, 19 de maio de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NETVOX

Cinema digital faz ofensiva em Cannes

MARIA ERCILIA
COLUNISTA DA FOLHA

O Festival de Cannes das estrelas, do tapete vermelho e das limusines continua onde sempre esteve, mas este ano, na surdina, surgiram novos personagens, longe dos flashes e da badalação. Em eventos paralelos, estão sendo exibidos filmes e animações em vídeo digital (ou DV).
Entre eles, "The New Arrival", um simpático curta-metragem, será exibido esta semana no festival, mas pode ser visto também no conforto da sua casa, no site AtomFilms (www.atomfilms.com).
Ele chama a atenção mais pela tecnologia que usa, IVideo, que permite que o espectador mude a perspectiva da câmera a qualquer momento durante os quatro minutos que dura o filme.
Essa tecnologia acaba introduzindo no filme um ritmo muito diferente do habitual. Parando para "rodar" pela cena a cada momento, nos sentimos mais exploradores que espectadores.
A suspensão da descrença que ajuda a entrar numa obra de ficção está quase ausente aqui, já que podemos pesquisar cada cantinho da história. O filme se torna um objeto a ser analisado e decomposto, e não apenas fruído.
Para a filmagem, foi usada uma câmera especial de 360 graus, da empresa Be Here. "The New Arrival", da diretora independente Amy Talkington, dá início ao 360 Degrees Forward, um concurso que premiará o primeiro lugar com equipamento para filmar dessa forma.
A Ipix, empresa que produz uma tecnologia semelhante à Be Here, tem, entre seus novos clientes, Steven Spielberg, que deve fazer experiências com os filmes em que o espectador escolhe que canto da tela quer explorar.
Com tecnologia mais simples, o diretor Mike Figgis também buscou uma multiplicidade de pontos de vista em seu mais novo filme, que não vai ser mostrado em Cannes, mas também foi todo rodado em DV. Estreou no Yahoo Film Festival, algumas semanas atrás. Figgis usou quatro câmeras simultaneamente e dividiu a tela em quatro, acompanhando a vida de um personagem de quatro pontos de vista diferentes. Segundo ele, a câmera digital acabou por aproximá-lo dos atores, por ser mais simples e "íntima".
"The Quantum Project", um filme de meia hora, já aposta numa narrativa totalmente tradicional, mas com uma temática para combinar com sua estratégia de lançamento. Ao mesmo tempo em que estreou em Cannes, também foi colocado na Internet.
Pagando US$ 3, como o de fita de vídeo, é possível fazer o download do filme e vê-lo no computador. A diferença de um aluguel de fita de vídeo é que você não precisa devolver e pode ver o filme quantas vezes quiser.
Só que a transferência pode levar mais de seis horas, ao fim das quais é preciso fazer o pagamento do filme e só depois assistir. "The Quantum Project" conta com dois atores conhecidos: John Cleese e Stephen Dorff.
Mas não foi muito bem recebido pela crítica. Nele, Stephen Dorff é um físico (difícil acreditar) que acaba por adquirir "poderes". Provavelmente esse filme só vai passar à história como o primeiro filme inédito a ser alugado via Internet. Outro azarão que acabou por conseguir uma exibição em Cannes é o canal de animação Spike & Mike's Sick and Twisted Festival of Animation (Festival de Animação Doentia e Pervertida de Spike & Mike). Esquisito e grosseiro demais para ser mostrado na TV, o trabalho da dupla é um sucesso na Internet, onde pode ser encontrado no site Ifilm.
Fãs da dupla Spike & Mike, que produz animações desde 77, reuniram-se numa sala num hotel de Cannes para ver sua seleção e, todos os dias, milhares de pessoas acessam as animações, bem mais fáceis de assistir na Internet que longas-metragens de cinema.
Enquanto não houver regulamentação na Internet para conteúdo que, por exemplo, foi censurado na TV, a rede continuará servindo como canal de expressão para filmes que dificilmente passariam pela censura norte-americana, apesar de geniais.
Interessante também é o trabalho independente "Letters from Homeroom" (www.lettersfromhomeroom.com), sobre duas meninas, colegas de escola, que não foi exibido em nenhum festival, por não ser propriamente um filme, mas vem obtendo destaque.
O leitor também pode começar em qualquer momento da narrativa, mas não há sensação de quebra alguma, pois é como se ele espiasse a cada vez um dia diferente da rotina das moças.


E-mail - ercilia@bol.com.br



Texto Anterior: Mostra: Cinemateca exibe produções russas
Próximo Texto: Teatro: Bonequeiros montam circuito SP-MG-RS
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.