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MÚSICA
Em "Diamonds on the Inside", quinto CD do californiano, há blues, funk, rock, reggae, gospel e ritmos africanos
Idealista, Ben Harper exibe versatilidade
BRUNO YUTAKA SAITO
DA REDAÇÃO
Há um perigo que ronda todo o
artista cult: quando ele é visto como uma espécie de salvador de
um cenário morno. O cantor e
compositor californiano Ben
Harper, 33, faz parte de uma seleta turma que cria signos indecifráveis e ignora os limites entre o
ídolo pop e o pregador.
Ao lançar seu quinto disco,
"Diamonds on the Inside", Harper já acumula uma década de
carreira, período em que foi visto,
ao lado de nomes como Beck e
Björk, como um herói da música.
Agora é hora de exibir os frutos
maduros das promessas.
Advoga para si o posto de messias. Um Bob Marley (1945-81)
moderno, que clama os ouvintes a
fazer uma revolução (na música
"With My Own Two Hands").
"Realmente acredito que é possível mudar o mundo", diz Harper
em entrevista à Folha. "Qualquer
um que puder adicionar algo à
consciência coletiva, à elevação
espiritual, pode contribuir na mudança do mundo."
Harper fala com a moral de alguém que, desde o primeiro CD, é
comparado a "apenas" figuras como Marvin Gaye (1939-84), Jimi
Hendrix (1942-70) e Bob Dylan.
Contestadores e referências conjugadas no passado (anos 60).
"Nunca se deve comparar pessoas, isso não é justo. Mas é óbvio
que eles me influenciaram fortemente, sou um dos poucos da minha geração que já estiveram em
um show deles [Marley e Dylan].
Em "Diamonds on the Inside",
fica claro que a filiação com o período não é apenas musical. Harper é uma figura dos 60 perdida
no tempo, em 2003. Críticas à sociedade e à política e forte espiritualidade, características do discurso dos músicos daquela década, servem de inspiração para ele.
São conceitos, utopias e sonhos
de uma realidade alternativa que
confortam o rapaz. "O mundo
perfeito é o mundo que você cria
para você mesmo, para sua família e para os amigos", diz Harper.
"Um mundo perfeito é somente
perfeito com imperfeições."
E a questão iraquiana, onde fica
nesse mundo perfeito? "Cara, essa
é uma conversa que vai longe. Sou
um homem de paz. Não há razão
para que uma das nações mais ricas do planeta não faça nada pelo
sofrimento humano no mundo. A
América precisa batalhar contra
seu próprio mundo. Se você não
luta contra essas coisas, você está
lutando em uma guerra."
Quem não conseguir alcançar a
transcendência proposta por
Harper encontrará um músico dividido entre a versatilidade e a pura crise de identidade. Estão aqui
as características que arrebataram
tantos seguidores: a voz aveludada, a delicadeza de baladas etc.
São "diamantes" de diferentes
espécies em um álbum que não se
pretende coeso: reggae ("With
My Own..."), o gospel e a música
africana ("Pictures of Jesus"),
blues ("When It's Good"), funk
("Bring the Funk"), rock ("So
High So Low"), a lista se estende.
Apenas não peça para Harper
explicar sua poesia. "Imprima as
letras das músicas, cara." Também não tente entender o que significam os tais "diamantes do lado de dentro" [tradução livre do
título do disco].
"Qualquer coisa que possa significar é o que [o título] significa.
Nem mesmo eu sei o que significa", despista. "Pode significar que
todos devem acreditar em sua
própria beleza interior; que, mesmo que você esteja com problemas, continua com um espírito
precioso dentro de você. Ainda
estou tentando descobrir."
DIAMONDS ON THE INSIDE. Artista:
Ben Harper. Lançamento: Virgin. Quanto:
R$ 27, em média.
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